quarta-feira, 11 de julho de 2012

15° Domingo do Tempo Comum


A Igreja canta e caminha em compasso de missão.
(Am 7,12-15; Sl 84/85; Ef 1,3-14; Mc 6,7-13)

Ainda não se apagou da nossa memória a recepção nada positiva que a comunidade de Nazaré dispensou a Jesus. O impacto provocado pela sua sabedoria logo se transformou em escândalo por causa da sua origem humilde. Mas isso não é um mero acidente de percurso: é o próprio método missionário de Jesus. Ele envia os discípulos recomendando despojamento e humildade, pedindo que tomem parte de sua missão. A comunidade cristã é uma assembléia de pessoas chamadas e enviadas. Paulo diz que Deus nos escolheu antes da criação do mundo para sermos santos e sem ambigüidades no amor, e o amor é a dinâmica e o coração da missão. O Senhor nos chama e envia para anunciar seu Evangelho. Ai de quem esquece disso e se contenta em ser profeta a serviço dos reis e sacerdote, oficiante de louvores tão dançantes quanto superficiais.
“Ele chamou os doze discípulos e começou a enviá-los dois a dois...”
A palavra Igreja significa etimologicamente assembléia ou reunião. A Igreja é uma autêntica assembléia de Deus, convocada e reunida por ele e em nome dele. Mas essa reunião tem uma finalidade que vai além da ação de se reunir. A razão de ser da Igreja é deixar-se enviar, colocar-se a caminho, assumir uma missão no mundo, continuar de forma criativamente fiel a própria missão iniciada por Jesus Cristo.
A Igreja é uma assembléia de pessoas enviadas, uma comunidade em missão. Há 40 anos a Igreja católica vem afirmando que é uma comunidade essencialmente missionária, e as comunidades, movimentos, paróquias e dioceses que não demonstram isso em palavras e ações comprometem a autenticidade da Igreja. Jesus Cristo não consumiu sua vida freqüentando as sinagogas, estudando os detalhes da lei sagrada ou oferecendo sacrifícios no templo.
Isso significa que a Igreja não é uma sociedade voltada para si mesma, auto-centrada. A Igreja é uma espécie de movimento para fora, uma entidade ex-cêntrica. Os sacramentos, os ministérios e todos os organismos e instituições eclesiais precisam ajudar os discípulos e discípulas de Jesus Cristo a saírem de si e se encarnarem de forma transformadora no mundo. As comunidades cristãs são como as rosas que se abrem, e não como os repolhos que se fecham sobre si mesmos.
“Mandou que não levassem nada pelo caminho...”
Preparar-se e capacitar-se para a missão que recebemos é sinal de responsabilidade pessoal e de apreço pelos destinatários do nosso serviço. No caso da missão que Jesus Cristo confia à comunidade cristã, a preocupação exagerada com os meios e com os recursos não deve travar as iniciativas nem adiar os projetos. O que é indispensável é o mergulho pessoal no Evangelho de Jesus Cristo e a disposição de partilhar gratuitamente a liberdade que de graça recebemos.
É nessa perspectiva que entendemos as orientações que Jesus dá aos discípulos/as que envia. Como ele mesmo, eles/as não precisam fazer cursos de especialização que podem afastar do povo e levar a falar uma língua complicada. E não devem se preocupar demais com meios poderosos e técnicas especiais. Uma túnica é o bastante, e as sandálias tornam o caminho menos pesado... “Jesus recomendou que não levassem nada pelo caminho, além de um bastão...”
Com isso não devemos concluir que a preparação espiritual e intelectual não seja necessária, mas ressaltar que não devemos colocar aquilo que é secundário no lugar do que é primário. Sem a experiência de fé e a liberdade que despoja e simplifica não há curso ou instrumento multimídia capaz de ajudar. Sem a atitude de irmão e companheiro que nos faz próximos daqueles que estão longe nos leva a compartilhar a vida e as lutas deles não existe missão frutuosa.
“Foi o Senhor que me tirou de trás do rebanho...”
Ser missionário/a é uma vocação desestabilizadora e não uma profissão que traz benefícios ou prosperidade individual. A missão tem uma dimensão profética, e nem sempre é aceita e aplaudida. Esse é o testemunho dos profetas do antigo testamento, do próprio Jesus Cristo e dos discípulos e discípulas que o seguiram pelos séculos afora. Sem querer, quem parte em missão acaba tornando-se uma pessoa incômoda e perigosa para o status quo.
Essa condição de incômodo é bem representada na liturgia de hoje pelo profeta Amós. O sacerdote Amazias o expulsa do templo e pede que volte para sua terra. Suas denúncias corajosas e concretas contra as oligarquias e contra a própria monarquia não soam bem “no templo do reino e santuário do rei”. Presumindo que o profeta esteja atuando na esperança de ganhar alguma coisa, Amazias determina:“Vá ganhar sua vida fazendo lá suas profecias.”
Mas o profeta não se rende, pois não assumiu sua missão por procuração ou por interesse, mas a recebeu do próprio Deus. Ele tem outros meios de vida, e sua profecia nasce da fidelidade ao Deus da Aliança, da fidelidade ao seu povo. “Eu não sou profeta, nem discípulo de profeta. Eu sou criador de gado e cultivador de sicômoros. Foi Javé quem me tirou de trás do rebanho e me ordenou: ‘Vai profetizar ao meu povo...”
“E deu-lhes poder sobre os espíritos impuros...”
O testemunho pessoal é o começo e o fundamento da missão, mas não é toda a missão. Anunciar “Jesus te ama” é bonito e verdadeiro, mas é muito pouco. Anunciar “Jesus salva” é ortodoxo, mas insuficiente. É uma pena que, tanto no passado como no presente, muitos/as missionários/as pensem que precisam defender Jesus diante de um mundo que se tornou indiferente ou resistente à religião. É o povo de Deus, e não Jesus, que precisa de defensores!
A missão tem também uma dimensão ativa, transformadora, libertadora. Nas palavras de Jesus no Evangelho de hoje, trata-se de expulsar demônios e curar os doentes. E isso não significa virar exorcista ou curandeiro, mas de criar condições para que as pessoas diminuídas, menosprezadas e oprimidas recuperem plenas condições de vida. É preciso identificar em cada situação quem são as pessoas e grupos aos quais são negadas as possibilidades de uma vida plena, e agir em favor delas.
Por mais que as ações espetaculares – e frequentemente tão coloridas quanto falsas – de expulsar os demônios e curar os doentes impressionem, a dimensão transformadora e libertadora da missão cristã se mostra melhor noutras iniciativas que dão menos ibope: na corajosa ação da CPT; no delicado e respeitoso trabalho do CIMI; na impressionante atividade da pastoral da criança; no ingrato trabalho da pastoral carcerária; na anônima dedicação da pastoral da saúde; etc.
“Nele, deus nos escolheu, antes da fundação do mundo...”
É uma verdade central da nossa fé que, em Cristo, Deus nos abençoou abundantemente e nos escolheu ainda antes de criar o mundo para sermos pessoas maduras e íntegras no amor. Escolhendo-nos, ele também abriu nossa mente à compreensão do mistério de sua santa vontade, nos adotou como filhos e filhas e nos introduziu na lista dos seus herdeiros/as. E isso não é pouco, coisa abstrata ou algo para um futuro incerto.
O que não podemos é pensar que isso é mérito ou privilégio. Somos filhos/as porque ele nos ama. Somos herdeiros/as porque ele nos acolhe e inclui na lista, sem levar em conta nossas ambigüidades e limites. E mais ainda: somos filhos/as para estender a família de Deus até os extremos da terra, num abraço que a ninguém exclui. Somos herdeiros/as do reino de Deus para administrar e potencializar o dinamismo da acolhida, da compaixão e da solidariedade redentoras.
“Misericórrdia e verdade se encontram, justiça e paz se abraçam.”
Jesus Cristo, profeta de Nazaré e missionário do Pai: tu nos ensinas que a vontade mais genuína do teu e nosso Pai é que o amor e a fidelidade se encontrem, a justiça e a paz se abracem, a fidelidade brote da terra e  a justiça se incline do céu. É isso que tu pedes que anunciemos e realizemos. Por isso, confiantes, te pedimos pelos/as servidores/as da Palavra, por aqueles/as cuja missão é, na medida do possível, atrair as pessoas a ti: abençoa o trabalho deles/as de modo que realizando-o possam também eles/as serem atraídos a ti e confirmados/as na alegria. Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf

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