segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Por uma evangelização nova (7)


O que quer a Igreja com a Nova Evangelização?

Tanto nas linhas como as entre-linhas não deixam dúvidas: o projeto de uma Nova Evangelização não surge da alegre vitalidade da comunidade eclesial, nem do desejo de oferecer aos homens e mulheres algo experimentado como precioso. Nasce da amarga sensação do afastamento dos fiéis da vida sacramental, de uma onda de cansaço e medo de muitas Igrejas frente à complexidade do mundo atual, do temido risco da criatividade e da diversidade que, aos olhos da Cúria, aparecem como atentados contra a unidade. Mau sinal!

O Instrumentum Laboris do Sínodo não esconde sua visão medrosa e pessimista do mundo: o resultado de todas as grandes transformações culturais das últimas déecadas “é a difusão de uma desorientação que se traduz em formas de desconfiança relativamente a tudo o que é transmitido acerca do sentido da vida e numa relutância para aderir total e incondicionalmente àquilo que nos foi dado como revelação da verdade profunda do nosso ser” (IL, § 7). Nessa situação, a fé perde sua força pública e é relegada festivamente à esfera privada da vida.

Este fenômeno se generaliza especialmente no mundo ocidental rico (“regiões de antiga cristianização”). Segundo o Instrumentum Laboris, a indiferença religiosa, o secularismo, o ateísmo e o consumismo, um estilo de vida como se Deus não existisse, colocam à prova as comunidades de fé. Na metade sul e pobre do planeta, onde permanece viva uma certa tradição cristã popular, o desafio seria representado pelo crescimento das seitas.

Pois é. A Nova Evangelização quer remar contra esta corrente, é pensada como antídoto contra esta doença que já contaminaria boa parte do corpo da humanidade. Pensa-se que somente uma nova evangelização poderá garantir o crescimento de uma fé límpida e profunda, capaz de converter as tradições populares em força de autêntica liberdade. Para “refazer em toda a parte o tecido cristão da sociedade humana”, é necessário “refazer o tecido cristão das próprias comunidades eclesiais que vivem nesses países e nessas nações” (IL, § 13).

“Reagir a esta situação é um imperativo com o qual o Papa Bento XVI se tem debatido desde o início do seu pontificado”, diz o Documento (§ 7). Daí o dever que a Igreja sente de “imaginar novos instrumentos e novas palavras” para tornar compreensível a palavra da fé neste contexto. Trata-se de “relançar o fervor da fé e do testemunho dos cristãos e das suas comunidades”, de multiplicar a coragem e as energias, de redescobrir a alegria e reencontrar o entusiasmo em comunicar a fé (cf. IL, § 9).

É difícil não ler neste projeto uma tentativa quase desesperada de reconquista do terreno perdido por parte do catolicismo. Por mais que se tente dizer que não, este é um projeto com odor restauracionista. Somente nesse tenebroso horizonte se torna compreensível a míope e falsa idéia de que a sociedade humana já teve um tecido cristão. Ora, o cristianismo nunca foi mais que 20% da humanidade, e só recentemente tem alguma influência na África e na Ásia. Somente na Europa ele chegou a influir decisamente na cultura e na sociedade. E o que leva a Igreja Católica e ver nas novas Igrejas, nascidas com marcas pentecostais, inimigos a serem combatidos e não parceiros a serem valorizados? É claro que tais Igrejas – seitas não é um conceito teológico, mas sociológico e ideologizado! – têm seus problemas e limites. Mas nós também os temos, e como!

E então, como iniciar ou levar adiante uma nova evangelização? Qual o interesse que move a Sede Apostólica nesta empresa? A hierarquia católica tem uma boa notícia a propor a todos os homens e mulheres? Ou o que a Cúria Romana deseja é simplesmente reconquistar terreno, ressuscitar privilégios, resgatar poderes? Bem, isso seria o contrário daquilo do Evangelho que Jesus Cristo viveu e anunciou. Não seria evangelização, mas conquista. E não teria ares de novidade, mas jeito de coisa velha.

Itacir Brassiani msf

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