Etty Hillesum
No dia 30 de novembro de 1943 morreu, em Auschwitz, para onde fora
levada há pouco mais de três meses, Etty Hillesum, jovem hebréia holandesa de
origem russa.
Esther (Etty) nasceu em 1914 em Middelburg, Holanda, filha de um
professor secundário e de uma mulher que há pouco havia fugido dos conflitos na
Rússia. Jovem de um temperamento agradável e dotada de brilhante inteligência,
Etty foi sobretudo uma pessoa de uma profunda vida interior, o que lhe permitiu
dar um sentido aos eventos trágicos da sua própria caminhada. Foi capaz de
manter um maduro diálogo com Deus mesmo no abismo do desespero e da falta de
sentido que foi o holocausto.
Depois e concluir os estudos de Psicologia e de Direito em Amsterdam, quando
as tropas nazistas ocuparam o país em 1940, Etty viu definido o destino de toda
a comunidade ebraica na Holanda. Acompanhada pela amizade e sob orientação do
psicanalista alemão Julius Spier, aos 8 de março de 1941 Etty começou a escrever
um diário no qual registraria o próprio itinerário espiritual até a chegada da
morte, no campo de concentração.
Todos conhecemos – mesmo que hoje alguns queiram cinicamente apagar esta
memória – o número de hebreus mortos na Shoah (holocausto): 6 milhões. Os escritos
desta jovem hebréia holandesa, publicados postumamente, podem ser de grande
ajuda para recordar, através de uma testemunha ocular, a desesperada busca de
sentido no interior de acontecimentos cuja grandeza pede, da parte de quem não
participou deles, unicamente uma memória atenta e silenciosa. Eis um trecho do
diário de Etty Hillesum.
Não tenho grandes ilusões
sobre como vão as coisas e renuncio inclusive à pretensão de ajudar os outros. Partirei
sempre do princípio de ‘ajudar Deus’ o mais que posso, e se for capaz disso,
isso significa que poderei também fazer algo pelos outros.
Sim, meu Deus, parece que tu
não podes fazer muito para mudar as circunstâncias atuais, mas também isso faz
parte da nossa vida. Eu não quero te responsabilizar pelo que está acontecendo.
Mais tarde tu mesmo dirás que os responsáveis fomos nós. Cresce em mim, no
ritmo das batidas do meu coração, uma certeza: tu não podes nos ajudar, mas
somos nós que devemos te ajudar, defender até o fim a tua casa em nós.
Meu Deus, procurarei te ajudar
a fim de que tu não sejas destruído dentro de mim, mas não posso te prometer
nada antecipadamente. Mas uma coisa se torna cada vez mais evidente para mim:
tu não podes nos ajudar, mas somos nós que devemos te ajudar e, assim, ajudar a
nós mesmos. A única coisa que podemos salvar nestes tempos, que é também a
única coisa que conta verdadeiramente, é um pequeno pedaço de ti em nós mesmos,
meu Deus. E talvez possamos também ajudar a te desenterrar dos corações
devastados dos outros.
(Comunità de Bose, Il libro dei testimoni, San Paolo, Milano,
2002, p. 556)
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