sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Ícones da missão: Filipe


Filipe e o eunuco: um guia para compreender

Um anjo do Senhor falou a Filipe, dizendo: "Prepare-se e vá para o sul, pelo caminho que desce de Jerusalém para Gaza; é o caminho que se acha no deserto." Filipe levantou-se e foi.
Nisso apareceu um eunuco etíope, ministro de Candace, rainha da Etiópia. Ele era dministrador geral do tesouro dela. Tinha ido a Jerusalém em peregrinação, e estava voltando para casa. Ia sentado em seu carro, lendo o profeta Isaías.
Então o Espírito disse a Filipe: "Aproxime-se desse carro e o acompanhe."  Filipe correu, ouviu o eunuco ler o profeta Isaías, e perguntou: "Você entende o que está lendo?"  O eunuco respondeu: "Como posso entender, se ninguém me explica?" Então convidou Filipe a subir e a sentar-se junto a ele.
A passagem da Escritura que o eunuco estava lendo era esta: "Ele foi levado como ovelha ao matadouro. E como um cordeiro perante o seu tosquiador, ele ficava mudo e não abria a boca.  Eles o humilharam e lhe negaram a justiça. Quem poderá contar seus seguidores? Porque eles o arrancaram da terra dos vivos." 
Então o eunuco disse a Filipe: "Por favor me explique: de quem o profeta está dizendo isso? Ele fala de si mesmo, ou se refere a outra pessoa?" Então Filipe foi explicando. E, tomando essa passagem da Escritura como ponto de partida, anunciou Jesus ao eunuco. 
Continuando o caminho, chegaram a um lugar onde havia água. Então o eunuco disse a Filipe: "Aqui existe água. O que impede que eu seja batizado?" Filipe lhe disse: "É possível, se você acredita de todo o coração." O eunuco respondeu: "Eu acredito que Jesus Cristo é o Filho de Deus!"  Então o eunuco mandou parar o carro. Os dois desceram junto às águas, e Filipe batizou o eunuco.
Quando saíram da água, o Espírito arrebatou Filipe, e o eunuco não o viu mais. Então rosseguiu sua viagem, cheio de alegria. (At 8,26-39)

O profeta Isaías havia escrito: “Não diga o homem castrado: ‘eu não passo de um galho seco’”. E anunciava que Deus, por causa da fidelidade à sua aliança, daria a eles um nome e um lugar melhor que aos seus próprios filhos e filhas (cf. Is 56,3-5). Quem sabe aquele eunuco já tivesse lido o rolo do profeta Isaías até essa bênção quando, no calor do meio-dia, no carro que rodava instável sobre a estrada pedregosa, lia “como um cordeiro...” (Is 53,7-8)...

Rico, mas sem futuro. Você era administrador de todos os bens da rainha, e certamente não lhe faltava nada. Mas sua fidelidade tinha um preço: você era eunuco. Talvez esse fosse apenas um título, um eco de antigos costumes. Ou talvez você carregasse de fato a extrema pobreza daqueles que são incapazes de relação sexual com uma mulher, desde o nascimento ou por causa da violência humana. Eunuco, homem sem futuro. Nome destinado a desaparecer. Sem direito ao prazer das relações.

Talvez, por acaso, você tinha a impressão de encontrar, de qualquer modo,  sua própria vida naquela história... Sua atenção se volta àquele homem que era levado à morte sem dizer uma palavra, sem deixar ninguém que pudesse dar um futuro ao seu nome...

Quem era aquela pessoa contra a qual o mundo descarregava sua raiva, sem levar em conta que ela carregava seus próprios males e não revidava com violência? E a quem era prometida uma grande descendência (Is 53,10-13)? E quando teria chegado o tempo, para ele e para todos os humilhados da terra?

Por isso, você não se surpreendeu quando aquele homem se aproximou de você, no meio-dia, em pleno deserto. As respostas de Deus nem sempre usam a mediação dos anjos... Você o acolheu no próprio carro, e perguntou quem era aquele misterioso sujeito do qual falava o profeta. Você desejava conhecer o nome, o rosto. E Filipe deu uma resposta, e você se tornou o primeiro cristão da África. A água do oásis lhe pareceu uma oferta e um sinal do próprio Deus. O que impedia?... Nada! A distância do templo não era um impedimento. O seu corpo diferente também não.

Certo, aquela água que corria sobre o corpo lhe parecia promessa e início de uma vida nova, de um futuro que a você parecia ter sido negado. A paisagem externa continuava árida e deserta, mas você se sentia uma árvore verde e transbordante de alegria. Você havia escutado um Nome. Foi ele que veio ao seu encontro no carro, e agora lhe carrega às costas.

Amigo Etíope! Peço que você continue sendo amigo e companheiro de todos os que peregrinam no deserto, das pessoas que atravessam a vida desencantadas pelas tribulações, em todos os cantos do mundo, em todas as situações de vida. Ajuda essa gente para que, como você, perceba os leves passos de Deus na discreta presença dos seus enviados.

E que os novos Filipes não se recusem a sentar ao lado deles, sem levar em conta o calor, a estranheza e os preconceitos. E isso para que possam gozar juntos a Boa Nova de um Deus que, por amor, carregou os nossos males e, em troca, nos deu a vida eterna.

Você, que experimentou essa refrescante alegria, sabe quanta sede tem nosso mundo. Para todos, há uma fonte de água que espera, como sinal de um deserto que já começa a chegar ao fim.

(Teresina Caffi, In cammino con il Vangelo. Icone della missione, EMI, Bologna, 2008, p. 78-81)

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