quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Uma destruição massiva: a geopolítica da fome (18)


A ONU incluiu o direito à alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora Seuil (Paris).

A solidariedade desvirtua o mercado?
Em dezembro de 2005, durante uma conferência ministerial em Hong-Kong, a Organização Mundial do Comércio (OMC), condenou a ajuda alimentar gratuita. Ela declarou que é inaceitável que o Programa Alimentar Mundial (PAM, organismo da ONU) e outros organismos distribuam gratuitamente alimentos oferecidos pelos países doadores (arroz, farinha, leite...) nos campos de refugiados, nas regiões devastadas pelas pragas e nos hospitais onde agonizam crianças subalimentadas.

Segundo a OMC, essa prática desvirtua o mercado (como se ele, o mercado, fosse um oceano de virtudes...). Um dos dogmas absolutos da OMC é que toda transferência de bens deve ter seu preço. Por isso, pediu que a ajuda in natura oferecida pelos países doadores fosse devidamente taxada. Em resumo: o PAM não deveria receber doações alimentares dos países, mas adquirir no mercado livre os alimentos que distribui aos países e populações pobres!

Graças a Daly Belgasmi e Jean-Jacques Graisse, respectivamente, diretor do escritório em Genebra e diretor geral de operações,  a reação do PAM foi imediata e vigorosa. “Uma viúva da AIDS na Zâmbia, com seus 6 filhos menores, não quer saber se a ajuda que recebe provém de uma doação in natura de um doador do PAM ou de uma contribuição monetária do mesmo doador. Tudo o que ela quer é que seus filhos vivam e não sejam obrigados a mendigar comida...”

“A Organização Mundial da Saúde (OMS) informa que a subalimentação e a fome são as mais ameaças à saúde. A fome mata anualmente mais que a AIDS, a tuberculose, a malária e todas as demais epidemias juntas... A OMC é um clube de ricos..., e o debate que ela levanta não é um debate sobre a fome, mas sobre vantagens comerciais... E inaceitável a redução da ajuda alimentar a mães e crianças famintas, que nada significam para o mercado mundial, em nome do liberalismo econômico... Nós queremos que o mercado mundial seja dotado de uma consciência!” (Memorandum do PAM, 08.12.2005; citado poe Ziegler à p. 188).

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