A ONU incluiu o direito à
alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta
por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves
textos sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São
informações e reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente
livro Destruction massive. Géopolitique de la
faim, de Jean
Ziegler, relator especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora
Seuil (Paris).
A solidariedade desvirtua o mercado?
Em dezembro de 2005, durante uma conferência
ministerial em Hong-Kong, a Organização
Mundial do Comércio (OMC), condenou a ajuda alimentar gratuita. Ela
declarou que é inaceitável que o Programa
Alimentar Mundial (PAM, organismo da ONU) e outros organismos distribuam
gratuitamente alimentos oferecidos pelos países doadores (arroz, farinha,
leite...) nos campos de refugiados, nas regiões devastadas pelas pragas e nos
hospitais onde agonizam crianças subalimentadas.
Segundo a OMC, essa prática desvirtua o mercado (como
se ele, o mercado, fosse um oceano de virtudes...). Um dos dogmas absolutos da
OMC é que toda transferência de bens deve ter seu preço. Por isso, pediu que a
ajuda in natura oferecida pelos
países doadores fosse devidamente taxada. Em resumo: o PAM não deveria receber
doações alimentares dos países, mas adquirir no mercado livre os alimentos que
distribui aos países e populações pobres!
Graças a Daly Belgasmi e Jean-Jacques Graisse,
respectivamente, diretor do escritório em Genebra e diretor geral de
operações, a reação do PAM foi imediata
e vigorosa. “Uma viúva da AIDS na Zâmbia, com seus 6 filhos menores, não quer
saber se a ajuda que recebe provém de uma doação in natura de um doador do PAM ou de uma contribuição monetária do
mesmo doador. Tudo o que ela quer é que seus filhos vivam e não sejam obrigados
a mendigar comida...”
“A Organização
Mundial da Saúde (OMS) informa que a subalimentação e a fome são as mais
ameaças à saúde. A fome mata anualmente mais que a AIDS, a tuberculose, a
malária e todas as demais epidemias juntas... A OMC é um clube de ricos..., e o
debate que ela levanta não é um debate sobre a fome, mas sobre vantagens
comerciais... E inaceitável a redução da ajuda alimentar a mães e crianças
famintas, que nada significam para o mercado mundial, em nome do liberalismo
econômico... Nós queremos que o mercado mundial seja dotado de uma
consciência!” (Memorandum do PAM,
08.12.2005; citado poe Ziegler à p. 188).
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