A ONU incluiu o direito à
alimentação entre os Direitos Humanos (cf. artigo 25). É na perspectiva da luta
por esse direito, um dos mais violados, que publico aqui uma série de breves textos
sobre o escândalo da fome e o direito humano à alimentação. São informações e
reflexões que simplesmente traduzo e resumo do recente livro Destruction massive. Géopolitique de la faim, de Jean Ziegler, relator
especial da ONU para o direito à alimentação, de 2000 a 2008.
O livro foi publicado em outubro de 2011, pela editora
Seuil (Paris).
O cínico humor dos burocratas do FMI.
No início da década de 1980 o preço do milho produzido
e consumido pelo povo da Zâmbia recebia uma subvenção estatal de 70%. O mercado
interno e as vendas externas eram regulamentadas pelo Estado. Os subsídios aos alimentos
representavam 20% do orçamento do país, mas todo o povo podia comer à vontade.
Mas o FMI impôs a redução e, depois, a abolição destes
subsídios aos alimentos, adubos e pesticidas. A educação e a saúde, que até
então eram gratuitas, foram privatizadas. As famílias passaram a fazer não mais
que uma refeição por dia. Sem acesso a boas sementes e fertilizantes, a
agricultura de sobrevivência entrou em decadência. Para sobreviver, os
agricultores tiveram que vender os animais, o que agravou ainda mais a
situação. Muitos se tornaram empregados mal pagos nas grandes plantações de
algodão controladas por empresas estrangeiras.
Entre 1990 e 1997 o consumo de milho caiu 25% e a taxa
de mortalidade infantil explodiu. Em 2010, 86% da população da Zâmbia vivia
abaixo da linha da pobreza, 72% com menos de 1 dólar por dia, 45% grave e
permanentemente subalimentada. E 42% das crianças com menos de 5 anos
apresentava apenas ¼ do peso normal definido pela UNICEF (cf. p. 182-183).
“A mentalidade americana domina nos edifícios de vidro
do n° 700 da Rua 19, Nordeste de Washington, sede do FMI. Os relatórios anuais
demonstram uma agradável inocência. O relatório de 1998 admite: ‘A longo prazo,
o plano vai melhorar o acesso aos recursos e aumentar as receitas da população.
Mas a curto termo, vai provocar uma redução do consumo de alimentos’” (p. 183).
“Os burocratas do FMI são dotados de humor. Na
conclusão do relatório, eles saúdam festivamente o fato de que a desigualdade
das condições de vida entre a população urbana e rural diminuiu
significativamente no período de 1991 a 1997. Por qual a razão? A diferença
diminuiu porque no meio urbano a miséria aumentou dramaticamente,
aproximando-se do nível da miséria no meio rural...” (p. 184).
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