CARTA DE
VITÓRIA EM DEFESA DA RESPONSABILIDADE
Os
Juízes de Direito integrantes do Fórum
Nacional da Justiça Juvenil, representantes dessa área da Justiça
especializada de todas as Unidades da Federação brasileira, reunidos por
ocasião do seu XIII Encontro Nacional,
que se realiza em Vitória, ES, no período de11 a 13 de abril de 2013,
manifestam a todos os demais segmentos do Sistema
de Justiça e às redes de atendimento à infância e juventude em particular,
e à Nação Brasileira em geral, as convicções seguintes:
1)
Preocupam-se com a permanente exposição dos cidadãos brasileiros à toda sorte
de riscos, violências e vitimizações, que entendem poderiam estar sendo
evitadas mediante soluções de maior responsabilidade na gestão das políticas de
Estado correspondentes.
2)
Compreendem, solidarizam-se e associam-se, assim, como autoridades, como
profissionais, como cidadãos e como pais de família, aos reclamos da sociedade
pela adoção de respostas de Estado mais efetivas na contenção ao alastramento e
agravamento da criminalidade, inclusive juvenil.
3)
Ponderam, entretanto, que o problema da violência é cercado de grande
complexidade e não será resolvido por soluções simplistas como o mero endurecimento
das legislações punitivas.
4)
Manifestam, em contrário, sua convicção de que a excessiva carga de vingança pública instalada no trato das questões
penais, ao contrário de solucionar, reveste atualmente um dos principais
fatores criminógenos, por um lado legitimando
a omissão das políticas públicas no trato dos apenados, e por outro gerando, em contrário, interpretações
jurídicas que tendem à permissividade e ao esvaziamento da efetividade do sistema
punitivo, exatamente como contraponto aos excessos da violência estatal.
5)
Nesse momento, em que a sociedade reclama diuturnamente e com cada vez maior
intensidade por mais segurança, garantia da ordem pública e proteção social, torna-se oportuno aplacar as respostas emocionais,
buscando uma reflexão serena, racional e aprofundada quanto à escolha das
estratégias que possam alcançar soluções efetivamente resolutivas que,
conciliando justiça e segurança, representem a mais elevada aspiração do bem
comum.
6)
Nesse contexto, apesar das graves deficiências que enfrenta, o Sistema de Justiça Juvenil deve servir de exemplo ao Sistema de Justiça
Criminal, e não ao contrário, como vem sendo postulado. Porque, embora desconhecida
da maioria, a Justiça Juvenil, que abrange atos infracionais praticados por
adolescentes entre 12 e 17 anos, tem-se mostrado incomparavelmente mais rápida, mais rigorosa, efetiva e
transformadora do que a Justiça Penal de adultos. E é assim por basear-se
num marco legal mais flexível, de caráter interdisciplinar e humanizante, indubitavelmente
mais qualificado e capaz de responsabilização do infrator do que a mera
retribuição punitiva.
7)
Assim, se o que a sociedade demanda é
mais segurança e não apenas o mero recrudescimento da retaliação vingativa,
com seus indissociáveis efeitos colaterais violentos que hoje contaminam as
comunidades marginalizadas, e dali se espalham para o sofrimento de todos, um debate democrático e responsável não pode
esgotar-se na questão de reduzir a idade penal – aliás cláusula pétrea e
por isso imodificável da Constituição da República - ou aumentar a duração das
medidas socioeducativas.
8)
Nesse sentido, oportuno ponderar que a Justiça Juvenil conta com um recente
instrumento legal, a Lei 12.594, de 18.01.2012, fruto de 14 anos de ampla
discussão com a sociedade e os setores técnicos especializados. E que a observância dos novos critérios legais no
atentimento aos infratores juvenis representa um avanço civilizatório que não
pode ser descartado em favor de um modelo de resposta penal que já se demonstrou
infrutífero ao longo dos séculos, e que hoje chega ao colapso, não se
justificando racionalmente que se pretenda insistir na receita de um remédio
que está matando o paciente.
9)
Advertem, com isso, que o brilho fácil e
emotivo dos discursos pelo mero endurecimento da legislação penal, seja
para adolescentes seja para adultos, representam
uma tentadora armadilha que visa a desviar o foco da discussão com relação
às verdadeiras raízes do problema da violência.
10) Disponibilizam-se, diante do exposto, e para isso
pedem apoio de todos os segmentos da imprensa e dos movimentos sociais, a discutir ampla e abertamente tais questões
com a sociedade, respeitada a complexidade de uma pauta que deve
necessariamente incluir questões como:
a) A
corrupção, o desvio de finalidade e o
desperdício dos orçamentos públicos;
b) A
gestão amadorística, desorientada e
assistemática das políticas públicas por inumeráveis pessoas sem a mínima
qualificação profissional nomeadas para cargos de confiança, cuja alternância e
descontinuidade ao longo dos anos não permitem a mínima estruturação e
estabilidade na condução dos serviços públicos a seu encargo;
c)
A insuficiência de investimentos, ou a gestão perdulária por falta de
integração, em políticas de prevenção e proteção social, notadamente nos campos
da educação, da assistência e da saúde;
d) O
abandono, a degradação e o descaso com as
instituições do sistema prisional, que já se estende assustadoramente para
as unidades socioeducativas;
e) O
desparelhamento dos quadros funcionais de
carreira que prestam apoio à efetividade da legislação responsabilizante,
tanto no sistema de justiça quanto no atendimento socioeducativo;
f)
A bem de ilustrar a
possibilidade de soluções de sucesso nesse campo, convidam a conhecer e reclamam que todos as Unidades da
Federação brasileira possam contar com um atendimento socioeducativo das medidas
de meio fechado com a qualidade do Sistema em construção no Estado do
Espírito Santo, concebido e executado nos moldes do SINASE.
11)
Nesse aspecto, ressaltam e por concluir manifestam
sua preocupação quanto ao andamento, a cargo do Poder Executivo nas várias esferas,
do que se refere à implantação do sistema de avaliação e monitoramento; ao
planejamento das políticas socioeducativas; e à definição das responsabilidades
pelo financiamento do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo,
determinações estas constantes da Lei 12.594/2012, e que, quando efetivamente
cumpridas, permitirão um dividendo social de qualidade e resolutividade
incomparável com as soluções de mudança legal reducionistas, aliás
habitualmente propostas ou insufladas pelos mesmos parlamentares e governantes
que se omitem em cumprir tais obrigações legais quando no exercício da
Administração Pública.
Sala de Sessões do Tribunal Pleno da Justiça do Estado
do Espírito Santo, aos treze dias do mês de abril de dois mil e treze.
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