sexta-feira, 5 de abril de 2013

Segundo Domingo da Pascoa


A missão brota do encontro pessoal com Jesus ressuscitado
(At 5,12-16; Sl 117/118; Ap 1,9-13.17-19; Jo 20,19-31)
A experiência da ressurreição de Jesus Cristo é feita em ritmo de missão. As portas da Igreja não podem permanecer fechadas, nem por medo, nem por comodismo. A Paz que Jesus nos oferece fazendo-se presente nas celebrações, não escondendo as marcas no seu corpo ferido, não pode ser acolhida como um convite ao deleite e à tranquilidade. Ele nos envia como cordeiros que arcam com o peso do pecado do mundo, que multiplicam seus gestos de compaixão libertadora. “Assim como o Pai me enviou, eu envio vocês.” Não lamentemos se não tivemos a graça de tocar nas mãos chagadas de Jesus Cristo ressuscitado. Não temos necessidade disso para reconhecer os outros como irmãs e irmãos e partir em missão, pois fazemos parte dos/as discípulos/as felizes porque acreditam mediante o testemunho daqueles/as que santificam o Nome de Deus porque morrem defendendo a vida, como o fizeram nossos irmãos mártires evangélicos Martin Luther King (+04.04.1968) e Dietrich Bohnoeffer (+09.04.1945).
“Jesus entrou e pôs-se no meio deles.”
Naquela noite do primeiro dia da semana as portas da sala onde se encontravam os discípulos desiludidos e assustados estavam firmemente trancadas. O ambiente externo era hostil e aquele punhado de sonhadores cheios de ambiguidade sentia-se desamparado. A lembrança da traição de Jesus por um dos discípulos, da negação pública de um dos principais e da deserção de quase todos doía e envergonhava. Era noite por fora e por dentro, e nem mesmo a Boa Notícia anunciada por Maria Madalena – “Eu vi o Senhor! – conseguia arrancá-los daquela prostração.
A noite e aquele ambiente fechado contrasta com a manhã luminosa e o ambiente aberto no qual Maria Madalena se encontra com Jesus ressuscitado (cf. Jo 20,1-18). Os discípulos vivem aquela mesma sensação de escuridão e ameaça que haviam experimentado enquanto atravessavam o lago, depois da tentativa frustrada de transformar Jesus em rei (cf. Jo 6,16-21). Mas as trevas da noite costumam ser proporcionais à luz da aurora que se esconde no seu ventre. Como aquela noite na qual Deus fez vigília e iniciou a libertaòão do povo do Egito (cf. Ex 12,42; Dt 16,1).
Superando todos os obstáculos, Jesus irrompe no meio dos discípulos. Não vem com acusações ou advertências. Os discípulos se alegram quando Jesus, mostrando-lhes as mãos e o lado, se apresenta como Cordeiro com o qual se inicia a festa do êxodo libertador. “A paz esteja convosco!” Ele faz questão de mostrar as mãos nas quais o Pai tinha posto tudo (cf. Jo 13,3); as mãos que realizaram as ações de Deus (cf. Jo 3,36); as mãos firmes das quais nenhuma ovelha pode ser arrancada (cf. Jo 10,28). Estas mãos simbolizam a historicidade e a concretude humana da sua presença na comunidade de fé.
“Como o Pai me enviou, também eu vos envio.”
É a experiência de uma presença que rompe os fechamentos e ilumina as trevas, alegra e pacifica os discípulos. “Então, se alegraram por verem o Senhor.” Porém Jesus parece querer evitar a tentação de uma paz que consola tanto quanto acomoda. Como Deus havia feito no início da criação, Jesus transmite seu Sopro aos discípulos e os constitui agentes vivificadores, sinais e instrumentos de uma nova  criação. “Então soprou sobre eles e falou: ‘Recebei o Espírito Santo’.”
Assim, a experiência pascal é mais que a certeza da presença de Jesus ressuscitado no seio de uma comunidade recolhida e encurralada pelo medo de um mundo hostil ou complacente consigo mesma. É também o êxodo corajoso e libertador de todos os fechamentos e redis para prosseguir o caminho trilhado por Jesus Cristo e estender sua ação em todas as latitudes. Mais ainda: não encontraremos e não conheceremos verdadeiramente Jesus Cristo ressuscitado enquanto não estivermos situados num horizonte de esperança e engajados num movimento de solidariedade.
“A quem perdoardes os pecados, serão perdoados...”
É claro que não encontramos no evento que hoje nos é narrado uma definição clara e completa da missão dos cristãos. Mas Jesus dá algumas indicações muito importantes: somos enviados/as como ele foi enviado pelo Pai, ou seja, como Cordeiros que carregam o pecado do mundo. Perdoar é libertar uma pessoa de uma carga ou fardo, de um peso que prende e impede de viver plenamente, como Jesus fizera com a mulher samaritana (cf. Jo 4,1-42), com aquele homem que sofria há 38 anos (cf. Jo 5,1-18), com a mulher acusada de adultério (cf. Jo 8,1-11), com o cego de nascença (cf. Jo 9,1-41)...
Mas se trata também de, conduzidos e fortalecidos pelo Espírito de Jesus, construir uma comunidade de homens e mulheres que procuram romper com o espírito do mundo e tomar distância das estruturas de pecado. Aqui o ‘pecado’ consiste em comprometer-se voluntariamente uma ordem injusta, enquanto que a comunidade cristã nasce como caminho e alternativa a este compromisso. Na medida em que a comunidade de discípulos/as vive concretamente esta alternativa, as pessoas que se opuserem a ela de forma consciente e voluntária acabam consolidando a própria situação de pecado.
“Muitos sinais e prodígios eram realizados entre o povo...”
A primeira expressão da missão que brota da experiência pascal é o testemunho de vida fraterna e solidária, diante do qual a sociedade toma posição. E a segunda é o anúncio de que isso é feito em nome de Jesus, “o primeiro e o último, Aquele que vive”, a pedra rejeitada pelos construtures e escolhida por Deus como pedra principal. É em Jesus que se fundamenta nosso novo viver e nossa irrenunciável missão. Mas a nossa missão como cristãos não se reduz a isto.
Desde os primeiros passos históricos, fiéis àquilo que viram e ouviram sobre Jesus, os cristãos viveram sua missão com gestos e sinais muito concretos. “Muitos sinais e prodígios eram realizados entre o povo pelas mãos dos apostolos”, diz sinteticamente o livro dos Atos dos Apóstolos. Pessoas atormentadas vinham da periferia de Jerusalém e doentes eram levadas às praças para que fossem tocadas ao menos pela sombra de Pedro. “E todos eram curados.”
Hoje a missão continua sendo tecida pelos fios do testemunho, do diálogo, do anúncio e o serviço de defender e promover a vida. Partindo do encontro com o Ressuscitado, o anúncio e o testemunho  se fazem verdade não apenas no cuidado dos doentes, mas também nas diversas iniciativas e cuidados pastorais em favor das crianças, dos encarcerados, dos migrantes, dos operários, da mulher marginalizada, da juventude, da terra, da família e de tantos outros grupos humanos necessitados.
“Se eu não puser a mão no seu lado, não acreditarei.”
Às vezes ficamos um pouco desconcertados diante da incredulidade de Tomé e da sua insistência em ver para crer. Mas é o próprio Jesus que provoca “mostrando-lhes as mãos e o lado” e convidando Tomé: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado...” E João, na visão relatada no Apocalipse, diz que voltou-se para ver quem lhe falava, e alguém semelhante a um ser humano pôs sobre ele a mão direita e disse: “Não tenhas medo!”
Integrando-se à comunidade apostólica e tocando o corpo chagado de Jesus, Tomé professa a fé que custara a amadurecer. “Meu Senhor e meu Deus!” Adquire a capacidade de romper com todos os demais senhores que disputam sua submissão e reverencia um Deus que se faz próximo, que se deixa tocar, que se faz carne vulnerável e torturada. Mas descobre que felicidade maior provam aqueles/as que acreditam mediante o testemunho dos outros, mesmo sem a privilegiada experiência que fizera.
Efetivamente, acorrrendo às comunidades cristãs os homens e mulheres de hoje têm o direito de sentir a mão de Jesus Cristo tocando seus ombros cansados e espantando o medo. Têm o direito de se encontrarem com um corpo de Cristo marcado pela perseguição e pelo serviço e alheio às honras e grandezas. Têm direito de encontrar a paz e a alegria de uma gente que reconhece ser pecadora e perdoada, que não se importa em ser pedra rejeitada pelos poderes deste mundo.
 “Bendito aquele que vem em nome do Senhor!”
Jesus de Nazaré, Cordeiro de Deus, o último num mundo obcecado pelo poder e o primeiro no Reino de Deus. Na mesa da tua Palavra e do teu corpo somos nutridos e encorajados a partir em missão de tirar o pecado do mundo, de amar e servir incondicionalmente. E o faz tornando-se uma bênção que de mil formas toca, desperta, cura, liberta. Dá-nos a graça de crer em ti a partir do testemunho daqueles que provaram teu amor e tocaram tuas chagas. Assim seja! Amém!
Pe. Itacir Brassiani msf

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