sexta-feira, 31 de maio de 2013

Passeando às margens do Mar da Galiléia

Tu vieste às margens do lago...

Logo de manhã deixamos Nazaré e ganhamos a estrada. Nosso destino eram as margens do Lago de Genesaré, também conhecido por Mar da Galiléia. Trata-se de um imenso e magnífico lago de 35 km de comprimento por 18 km de largura e uma fundura média de 14 mt. Este riquíssimo reservatório de água doce está na região da Galiléia, a 200 mt abaixo do nível do mar! Deste lago é bombeada a água que abastece praticamente o país inteiro, mediante um complexo sistema nacional de águas.
Fomos conversando sobre o significado cristológico dessa região. Na verdade, Jesus viveu praticamente toda a sua vida por aqui. Segundo os evangelhos sinóticos, sua única viagem a Jerusalém, depois de ter alcançado reconhecimento como pregador e reformador, foi aquela que acabou levando-o ao tribunal e à cruz. De resto, quase toda sua ação profética ocorreu na Galiléia e arredores.
Passamos ao lado da cidade de Migdal, mas não paramos. Trata-se da famosa vila de Magdala, onde viveu Maria, conhecida como Maria Madalena, que tem um papel importantíssimo no evangelho segundo João. Nesta cidade recentemente foram encontrados restos da sinagoga mais antiga de que se tem conhecimento: data mais ou menos do ano 100 antes de Cristo.
Vista a partir da igreja das bem-aventuranças
“Bem-aventurado quem tem fome e sede de justiça...”
Nossa primeira parada foi no monte das bem-aventuranças. Ali, tendo a imensidão e a belza do mar diante de si, mas também um mar de gente sedenta de palavras de vida, Jesus pronunciou o pequeno discurso conhecido como Sermão da Montanha (Mt 5-7), do qual fazem parte as bem-aventuranças (Mt 5,1-12). É a pregação que traça a linha divisória entre o cristianismo nascente e o judaísmo.
A paisagem é magnífica, deslumbrante. Na frente, o mar tranquilo a perder de vista. Atrás, mais acima, as montanhas pedregosas. Ao redor, hoje, modernas plantações de frutas. E ali uma pequena igreja e uma moderna pousada, tudo circundado por jardins cuidadosamente conservados. O clima é envolvente em sua tranquilidade e serenidade, apesar do grande número de visitantes.
Depois de termos rezado individualmente na igreja, reunimo-nos num dos espaços reservados à oração e à partilha, voltamos a cantar ‘Jovem galileu’ e lemos calmamente as bem-aventuranças. Fomos trazendo presente tanta gente que nos acompanha, sintonizada, e se encomendou à nossa oração. E renovamos a consciência da missão que brota da confiança que Jesus deposita em nós: “Vocês são o sal da terra... Vocês são a luz do mundo...” E isso é tudo menos algo automático e descontado...
“Vocês serão pescadores de gente...”
Vista parcial do Mar da Galiléia
Descemos a montanha e ganhamos a margem do lago. Foi por estas paragens que Jesus encontrou e chamou os primeiros discípulos, propondo que aprendessem a pescar diferente. O calor queimava nossos ossos, pois estávamos uma espécie de depressão geológica, 200 mt abaixo do nível do mar. Lá nos esperava um barco para um breve passeio no lago de Genesaré.
Para nossa alegria, encontramos ali um grupo de quarenta peregrinos brasileiros, cuja maioria vinha do Paraná (Apucarana e Londrina). Fazia parte do grupo também uma moça que frequenta a Paróquia São José Operário, na Ilha do Governador. Como o grupo era exclusivamente de brasileiros (com exceção do Edmundo), tivemos direito a hasteamento da bandeira brasileira no mastro do barco, com hino nacional e tudo. E a emoção prosseguiu com o ‘Jovem Galileu’, ‘Jesus Cristo’ (do Roberto Carlos) e ‘Tu viestes às margens do lago’ cantadas por todos.
Interior da igreja da multiplicaçao dos paes
Como não lembrar de tudo o que aconteceu envolvendo Jesus e os discípulos nas margens desse lago? O chamado dos primeiros seguidores, a travessia no meio da tempestade, as pescas frustradas, a pesca do peixe com a moeda para pagar o imposto... Afinal, Cafarnaum, Betsaida e Tiberíades ficam logo ali... O tempo foi curto para recordar tantos acontecimentos biblicamente importantes.
“Tu me amas mais que estes outros?”
Concluído o breve passeio pelas águas calmas, nosso grupo foi um pouco adiante, ao lugar onde Jesus teria multiplicado os pães e peixes para a multidão faminta. Aqui faz muito sentido oferecer ao povo também peixe, e não apenas pão, como no deserto. Sobre a pedra onde Jesus teria realizado esta sinal existe hoje uma igreja mantida pelos beneditinos alemães, que conserva restos de uma basílica bizantina do século IV, com o famoso mosaico da cesta de pão e dos peixes, clássico símbolo das primeiras comunidades cristãs.
Daí seguimos à pé uns duzentos metros e chegamos ao lugar conhecido como ‘primado de Pedro’. Trata-se de uma pequena e simples igreja construída praticamente sobre o mar, num antigo porto de pescadores. Foi ali que os apóstolos voltaram a pescar depois da crise da crucifixão de Jesus (cf. Jo 21,1-19). E foi ali que, depois de uma noite de trabalho frustrado, os discípulos obedecem a ordem de um desconhecido, lançam as redes de novo e as recolhem cheias de peixes.
Aqui Jesus ofereceu peixe e pao aos
apostolos, depois dauela pesca...
No interior do pequeno templo erguido quase sobre as águas do lago ainda se conserva exposta a rocha sobre a qual Jesus ofereceu peixe e pão aos discípulos, envergonhados por terem abandonado Jesus no caminho da cruz e cansados por sucessivas pescas frustradas. E foi ali que Jesus testou a adesão de Pedro, perguntando três vezes se ele o amava mais que os outros. O fogo sob os peixes lembrava aquele outro, do pátio do sinédrio, quando Pedro negou Jesus. E a tríplice pergunta trazia à memória a tríplice negação.
Ali, sozinhos no interior da igrejinha, lemos João 21,1-19. Refletimos sobre nossos cansaços, vazios e desânimos. Lembramos de amigos e amigas que enfrentam grandes dificuldades pessoais e pedem nosso apoio e oração. Tomamos consciência de que nosso amor a Jesus precisa ser mostrado na ação de cuidar das ovelhas e cordeiros, dos amados e preferidos de Jesus. E que a missão não pode prescindir do seguimento.
Terminamos cantanto, emocionados, “Senhor, olhaste em meus olhos, e, sorrindo pronunciaste meu nome. Lá na praia eu deixei o meu barco... E contigo buscarei outro mar.” Assim seja, sempre. Amém!
Pedro, sua sogra e Jesus
Nosso roteiro deste dia 31 de maio terminou em Cafarnaum. O nome significa ‘cidade de Naum’, mas parece que não se trata do conhecido profeta. Ali, como sabemos, vivia Pedro, ao que parece, na casa da sogra. E foi nesta vila de pescadores, com uns duzentos e cinquenta moradores, que Jesus passou a residir, com os discípulos que se juntavam a ele, depois que os nazaretanos ameaçaram empurrá-lo precipício abaixo.
Restos da sinagiga do século IV, em Cafarnaum
Em Cafarnaum visitamos as ruínas de uma sinagoga do século IV, em cujo sub-solo estão restos da sinagoga que teria sido frequentada por Pedro, pois fica a alguns metros dos restos da casa da sua sogra, que seria também aquela na qual apenas alguns amigos baixaram pelo teto a maca de um doente a fim de que Jesus o curasse. Sobre os restos dessa casa, recentemente foi construída uma moderna e suntuiosa igreja.
Voltando a Nazaré, passamos por Tiberíades, cidade construída por Herodes no ano 20 dC e batizada com este nome para homenagear o imperador romano Tibério. Por causa disso e de outras coisas, parece que Jesus nunca visitou Tiberíades, mesmo que ficasse bem perto de Cafarnaum. Tiberíades é uma das poucas cidades que teve presença predominante e contínua de hebreus desde a antiguidade. Hoje é um movimentado polo turístico, especialmente por causa das suas belas praias.

Itacir Brassiani msf

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