sábado, 27 de julho de 2013

17° Domingo do Tempo Comum

Na oração, alargamos a visão e confirmamos a caminhada.
(Gn 18,20-32; Sl 137/138; Cl 2,12-14; Lc 11,1-13)

A oração faz parte da vida de Jesus Cristo e da vida dos cristãos. Há quem reza muito e quem reza pouco; quem prefere rezar sozinho e quem prioriza a oração comunitária; quem reza para sustentar a luta e quem reza em vez de lutar; quem se dedica ao louvor e quem se concentra nas lamentações. Há também grupos que se encarregam de rezar por procuração e pessoas que atribuem a outros a tarefa de rezar em seu lugar. E não faltam santos e santas que advertem sobre a insuficiência da nossa oração. Até Maria, em algumas aparições mais recentes, parece obsessionada pela questão da oração. Porém, o mais importante não é a quantidade de tempo dedicado e nem as fórmulas usadas para rezar, mas a atitude profunda e global diante de Deus e da urgência de realizar seu reinado no mundo.
“Jesus estava orando num certo lugar...”
A catequese de Jesus sobre a oração que a liturgia nos propõe hoje está inserida no contexto da caminhada para Jerusalém, onde se daria o confronto decisivo entre seu projeto de vida e os poderes da oficialidade. Depois de nos contar o ensino de Jesus sobre a necessidade de fazer-se próximo de quem está em situação de vulnerabilidade e de nos apresentar a lição na casa de Marta e de Maria, Lucas começa dizendo muito genericamente que “um dia, Jesus estava orando num certo lugar”.
A oração de Jesus está claramente a serviço da fidelidade à decisão de construir o Reino de Deus mediante o serviço profético em favor dos últimos e o enfrentamento das forças que se lhe opõem. Nos momentos de oração Jesus vislumbra e recoloca diante de si o horizonte maior do Reino de Deus e confirma seus passos nesta direção. Jesus não parece preocupado em pedir que os discípulos rezem, mas ele mesmo se retira em oração para confirmar sua identidade e renovar sua responsabilidade.
Observando Jesus em oração, são os discípulos que pedem que lhes ensine a rezar. Eles conheciam os ritos e fórmulas de oração ensinados por João Batista e por outros líderes, como os que pertenciam ao grupo dos essênios. Parece que os discípulos desejam que Jesus lhes ensine ritos e práticas definidas e rígidas de oração, como aquelas que haviam aprendido no judaísmo. Anelam por práticas espirituais que dispensem das exigências da conversão ao Reino, do despojamento e do dom de si.
“Pedi e vos será dado...”
A oração praticada e ensinada por Jesus Cristo supõe a consciência de que somos seres carentes, necessitados e limitados diante da grandeza da missão. Em outras palavras, a base humana da oração é a abertura ao futuro, aos outros e a Deus. Quem dispõe de todos os poderes não precisa pedir nada nem agradecer a ninguém. E quem está absolutamente satisfeito com o presente, não espera nada para a futuro, a não ser um prolongamento repetitivo do presente.
Mas longe de induzir à passividade e desenvolver uma visão mágica da vida, a oração cristã ajuda a fecundar e potencializar os recursos de que dispomos para construir a vida e transformar a história. O pedido de quem reza supõe, expressa e cultiva a consciência de que algo importante falta à história, à Igreja ou às pessoas singulares. No pedido orante está imbutido o senso de urgência e de responsabilidade pessoal e comunitária diante dos dramas e necessidades do mundo.
“Pai, santificado seja o teu nome.”
Para Jesus, Deus é Alguém bom, presente e próximo, e a oração se sustenta numa relação de absoluta confiança, amizade e intimidade com Ele, como aquela do/a filho/a que confia no pai e na mãe e os sente próximos. É uma confiança que permite até a insistência em favor dos/as amigos/as, como demonstram o pedido de Abraão em favor do povo de Sodoma e a parábola do vizinho que bate à porta do amigo para pedir-lhe ajuda. “Vais realmente exterminar o justo com o ímpio?”
Segundo a prática e o ensino de Jesus, a oração parte da contemplação da ação libertadora de Deus que está em curso na história. É isso que significa dizer “santificado seja o teu Nome”. Na tradição bíblica, Deus é santificado quando liberta os oprimidos, perdoa os pecadores, sacia os famintos, repatria os exilados, garante um abrigo aos deserdados. Ou, como cantamos hoje: “Teu Nome é santificado naqueles que morrem defendendo a vida. Teu nome é glorificado quando a justiça é nossa medida.”
Mas o rio da santidade de Deus, que fertiliza a terra e possibilita uma vida abundante aos seus filhos e filhas, tem um leito ainda  muito estreito que precisa ser alargado. E aqui a oração entra como uma pedagogia que suscita e ressuscita em nós o ardente anseio do Reino de Deus. “Venha o teu Reino!” Esta súplica profunda e envolvente ajuda a evitar duas atitudes pouco cristãs: a conformidade resignada com o mundo do jeito que ele está; a preocupação escapista com uma indefinida vida depois da morte.
“Dá-nos a cada dia o pão cotidiano...”
A oração cristã é uma ação essencialmente comunitária, e está voltada ao presente histórico. E isso está patente na segunda parte da oração que Jesus nos ensinou: os pedidos estão na segunda pessoa do plural e são expressão da voz de uma comunidade. Mesmo quando oração é feita individualmente, ela sempre supõe uma comunhão real, profunda e visceral não apenas com os cristãos da comunidade ou da mesma Igreja, mas com a humanidade e a criação inteira.
É em nome da humanidade à qual nos sentimos intrinsecamente unidos que pedimos: “Dá-nos, a cada dia, o pão cotidiano, e perdoa-nos os nossos pecados...” O primeiro pedido adquire tons dramáticos e proféticos num contexto histórico no qual mais de um bilhão de pessoas – quase 20% da população mundial! – não dispõem da alimentação necessária em termos de quantidade e qualidade. E não se trata de postular o pão para um futuro distante, mas para cada dia, para hoje!
Um segundo pedido ensinado por Jesus na sua síntese da postura de uma pessoa orante é o perdão dos pecados. Não obstante os moralismos que se sucedem e pesam sobre a cabeça e a alma de tanta gente discriminada, com o conceito ‘pecado’ é designada a situação humana de quem não alcançou a plena realização, de quem ficou aquém ou perdeu o rumo. Paulo diz que Deus anulou o documento das nossas dívidas, pregando-o na cruz. Mas a oração ajuda a assimilar existencialmente o perdão já concedido.
“E não nos deixe cair em tentação.”
Na oração nos propõe, que Jesus Cristo nos previne contra as muitas tentações que nos rondam. No caso dos Doze, temos bem presente quais são: uma ideologia religiosa violenta e nacionalista; uma evangelização integrista, pronta a proibi-la a quem não pertence ao própio grupo e a punir os que a ela se opõe (cf. Lc 9,49-56); uma religião que se refugia em Deus e relativiza o amor concreto (cf. Lc 10,25-37); uma preocupação exagerada com regras e ritos e pouco atenta ao discipulado (cf. Lc 10,38-42).
São reais as tentações que hoje rondam a vida das comunidades cristãs, e uma delas é tratar as diversas Igrejas ou confissões cristãs como heréticas, inferiores ou inimigas, como se não tivessem a mesma origem, a mesma base e o mesmo objetivo. Somos responsáveis diante de Deus pelo obstáculo que nossas divisões provocam aos homens e mulheres de boa vontade que buscam a Deus de coração sincero mas tropeçam no nosso contra-testemunho.
Uma segunda tentação na qual caímos com muita frequência, inclusive quando rezamos, é o desprezo ou a fuga da história de dor e esperança do tempo no qual vivemos. Caímos na tentação de multiplicar regras e cânones litúrgicos, hierarquizar protagonistas e agentes, priorizar as necessidades espirituais e individuais, focalizar tudo na vida depois da morte. Quando o Reino de Deus não nos interessa mais, como podemos santificar seu Nome? Ou nossa oração tem raízes na história, ou não é cristã.
“O pai do céu dará o Espírito Santo aos que lhe pedirem.”
Jesus de Nazaré, filho amado do Pai, irmão e amigo da humanidade e mestre na arte de rezar: ajuda-nos a pedir o que realmente necessitamos para continuar no teu caminho, e não aquilo que nos agrada ou facilita as coisas. Tanto nosso pai Abraão como tu mesmo sublinhas a importância de pedir com confiança e até insistir nos pedidos. Mas qual é o pedido que o teu e nosso Pai não deixa sem resposta? Certamente não é o alimento (peixe e ovo), nem simplesmente a saúde, o sucesso ou uma boa morte. O que necessitamos realmente, e tu nos dás seguramente, é teu Espírito, sem o qual não há discipulado, profecia, liberdade e vida verdadeiras. Envia-nos teu Espírito, Senhor, e isso nos basta! Assim seja!

Pe. Itacir Brassiani msf

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