sábado, 2 de novembro de 2013

Dia dos Finados

A esperança dança na corda bamba...


A morte, tanto aquela biológica, no fim dos dias, como a que nos ameaça na angústia e no estreitamento da vida, é uma dor e uma perda lastimável, questionada inclusive pelas sagradas escrituras. Cremos na ressurreição, sim, mas ela permanece sempre no horizonte da fé e da esperança. E, muitas vezes, “a esperança dança na corda bamba, de sombrinha, e a cada passo dessa linha pode se machucar”, canta o poeta, recorrendo à metáfora do artista circense.

Expressando uma situação pessoal e social de extremo limite, o profeta Isaías diz, interrogando a si mesmo e questionando ao próprio Deus:
Bem no meio da minha vida, eu me vou.
Pelo resto dos  meus anos, ficarei postado à porta da mansão dos mortos.
Não verei mais a Javé na terra dos vivos, nem verei mais ninguém entre os habitantes da terra...
De fato, a mansão dos mortos não te louva; não é que te entoa hinos.
Quem baixa à cova não espera mais a tua fidelidade...
Salva-me, Javé, e tocaremos nossas harpas todos os dias da nossa vida no Templo de Javé” (38,10-20)

Numa situação semelhante, Jó, personagem imaginativo que desafia e recusa as teologias cínicas que tentam culpabilizar o inocente que sofre, afirma sua esperança de forma contundente, mas sempre no interior da própria história:
“Eu sei que o meu redentor está vivo eque no fim se levantará acima do .
Mesmo com a pele aos pedaços e em carne viva, eu verei a Deus.
Eu mesmo o verei, e não outro; eu o verei com os meus próprios olhos” (19,25-27).

Parece-me mais do que justo desejar vida longa e boa, reivindicar o direito de proclamar o louvor a Deus nesta vida, contemplar sua face compassiva e segurar a mão que ele estende para nos levantar do pó. Mesmo que seja com a pele aos pedaços e em carne viva!

Ancorados nesta esperança, que é experiência no horizonte da fé, ousamos acolher e abraçar a morte corporal, a das pessoas que amamos e a nossa, quando vier. Aquele que sempre nos abraçou, não virando o rosto diante da nossa pele despedaçada e das nossas chagas vivas, vibrando ao ritmo da nossa ternura e dos nossos sonhos, também nos espera de braços abertos logo ali, do outro lado, depois do escuro e breve corredor da morte.

Contemplamos o que Jesus de Nazaré acreditou, ensinou e experimentou. Ele desceu ao assustador barraco  dos mortos sociais e biológicos, irmanou-se àqueles que eram nada, e com eles, conosco, se reergueu e regenerou. E diz:
Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá jamais” (Jo 11,25-26).

Como isso se faz e se fará, não sabemos. Mas acreditamos nele e naquilo que nos promete. Esta é a nossa esperança, mesmo que se apresente com algumas  fraturas, adquiridas em tantas e ousadas travessias na corda bamba. É isso que cremos e esperamos. Nada mais que isso. Ou melhor: nada menos que isso!


Itacir Brassiani msf

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