Eu?!... Transferido?!
Após o
último Encontro dos Irmãos, de quando
em quando eu matutava com meus botões: “Todos podem ser transferidos, menos eu!...”
Sem demora, uma voz começou a advertir-me: “Afinal, quem é você?... Por acaso, você
é diferente ou mais importante do que todos os outros?”
Certa
noite recebi a visita dos coirmãos Itacir e Euclides. Vinham sondar meus
desejos e aspirações. Respondi que estava ao dispor da Província. Em diálogo
franco e fraterno, acertamos a minha transferência ao juniorado do Bairro
Castelarin, em Santo Ângelo. Ao final, pilheirei: “Lá estarei mais próximo da
família e do cemitério!...” Esquecia-me de que em Santo Ângelo iniciei a minha
caminhada na Congregação e o ministério sacerdotal, na comunidade do Seminário,
da qual levei saudades ao ser transferido para o Rio de Janeiro, um ano
depois...
Agora, já
instalado no Bairro Castelarim, estou iniciando a convivência com os oito
junioristas. Constato que muitos coirmãos vivem experiência semelhante. Quase
metade dos coirmãos “pôs o pé na estrada” com destino a outras paragens ou
atividades. Nada de anormal, ao meu ver. Lembro que a voz da obediência foi,
primeiramente, ouvida e acatada pelos coirmãos da anterior e da atual
Coordenação Provincial. Foram eles os primeiros
a quem solicitamos boa quota de renúncia e disponibilidade. Obedientes à nossa
vontade, submeteram-se ao resultado da eleição capitular. De tabela,
registro que eles, bem como a comunidade e o povo santoangelense, foram
duramente atingidos. Oxalá tal “perda” resulte em lucro não pequeno à Província
toda.
Aliás,
pensando bem, em um instituto religioso da natureza do nosso, a permanência em
determinada comunidade ou paróquia é temporária, passageira. Nossa pertença
propriamente dita é à Província. Somos transeuntes e romeiros. Hoje aqui;
amanhã noutro lugar. Até nisso nos é dada a possibilidade de vivenciar o discipulado
abraçado por todos nós. Nosso cada vez mais lembrado Pe. Berthier dizia-nos: “O
que importa é estar lá onde Deus nos quer”.
Temos
conhecimento – relativo, é claro! – do quanto têm sofrido alguns coirmãos com a
transferência. Ninguém os condena por isso. Todos compreendemos que deixar
amigos, projetos, o povo amado, dilacera o coração. Como lenitivo a tamanha
amargura, que tal se pouséssemos um olhar profundo e demorado no peito chagado
do Mestre Crucificado?!... Feliz aquele que aceita a oportunidade de dar um
pouco do seu sangue por Ele e pelo Reino! É salutar colocar-se com Jesus na
patena, fazendo de si oferta viva, ao celebrar a Eucaristia!
Estamos
no tempo quaresmal. O Mestre amado encaminha-se ao Calvário. Assumamos a “cruz
da transferência” e vamos com Ele até o fim, aconteça o que acontecer! No
período de aceitação e de adaptação à nova realidade e às tarefas assumidas,
somos como aqueles que, na partida e nessa fase da vida, semeiam entre
lágrimas. Logo mais colheremos frutos entre gritos e cânticos de alegria, pois quem
serve o povo com amor e por amor, recebe amor centuplicado. Jamais ficará na
sepultura do esquecimento. Viverá para sempre no coração do povo.
Encaremos
toda transferência como oportunidade de mais vida e ressurreição. São os votos
pascais que faço aos coirmãos que, na alegria ou na tristeza, assumiram novo
campo de trabalho na Província em prol do Reino.
Pe. Rodolpho Ceolin msf
(Artigo
publicado em O Bertheriano, Ano XVII, n° 61, Março/1999, p. 8)
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