segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Reflexões do Pe. Ceolin msf (1)

Eu?!... Transferido?!


Após o último Encontro dos Irmãos, de quando em quando eu matutava com meus botões: “Todos podem ser transferidos, menos eu!...” Sem demora, uma voz começou a advertir-me: “Afinal, quem é você?... Por acaso, você é diferente ou mais importante do que todos os outros?”
Certa noite recebi a visita dos coirmãos Itacir e Euclides. Vinham sondar meus desejos e aspirações. Respondi que estava ao dispor da Província. Em diálogo franco e fraterno, acertamos a minha transferência ao juniorado do Bairro Castelarin, em Santo Ângelo. Ao final, pilheirei: “Lá estarei mais próximo da família e do cemitério!...” Esquecia-me de que em Santo Ângelo iniciei a minha caminhada na Congregação e o ministério sacerdotal, na comunidade do Seminário, da qual levei saudades ao ser transferido para o Rio de Janeiro, um ano depois...
Agora, já instalado no Bairro Castelarim, estou iniciando a convivência com os oito junioristas. Constato que muitos coirmãos vivem experiência semelhante. Quase metade dos coirmãos “pôs o pé na estrada” com destino a outras paragens ou atividades. Nada de anormal, ao meu ver. Lembro que a voz da obediência foi, primeiramente, ouvida e acatada pelos coirmãos da anterior e da atual Coordenação Provincial.  Foram eles os primeiros a quem solicitamos boa quota de renúncia e disponibilidade. Obedientes à nossa vontade, submeteram-se ao resultado da eleição capitular. De tabela, registro que eles, bem como a comunidade e o povo santoangelense, foram duramente atingidos. Oxalá tal “perda” resulte em lucro não pequeno à Província toda.
Aliás, pensando bem, em um instituto religioso da natureza do nosso, a permanência em determinada comunidade ou paróquia é temporária, passageira. Nossa pertença propriamente dita é à Província. Somos transeuntes e romeiros. Hoje aqui; amanhã noutro lugar. Até nisso nos é dada a possibilidade de vivenciar o discipulado abraçado por todos nós. Nosso cada vez mais lembrado Pe. Berthier dizia-nos: “O que importa é estar lá onde Deus nos quer”.
Temos conhecimento – relativo, é claro! – do quanto têm sofrido alguns coirmãos com a transferência. Ninguém os condena por isso. Todos compreendemos que deixar amigos, projetos, o povo amado, dilacera o coração. Como lenitivo a tamanha amargura, que tal se pouséssemos um olhar profundo e demorado no peito chagado do Mestre Crucificado?!... Feliz aquele que aceita a oportunidade de dar um pouco do seu sangue por Ele e pelo Reino! É salutar colocar-se com Jesus na patena, fazendo de si oferta viva, ao celebrar a Eucaristia!
Estamos no tempo quaresmal. O Mestre amado encaminha-se ao Calvário. Assumamos a “cruz da transferência” e vamos com Ele até o fim, aconteça o que acontecer! No período de aceitação e de adaptação à nova realidade e às tarefas assumidas, somos como aqueles que, na partida e nessa fase da vida, semeiam entre lágrimas. Logo mais colheremos frutos entre gritos e cânticos de alegria, pois quem serve o povo com amor e por amor, recebe amor centuplicado. Jamais ficará na sepultura do esquecimento. Viverá para sempre no coração do povo.
Encaremos toda transferência como oportunidade de mais vida e ressurreição. São os votos pascais que faço aos coirmãos que, na alegria ou na tristeza, assumiram novo campo de trabalho na Província em prol do Reino.
Pe. Rodolpho Ceolin msf


(Artigo publicado em O Bertheriano, Ano XVII, n° 61, Março/1999, p. 8)

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