sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Solenidade da manifestação de Jesus

Deus não pertence a nenhum povo ou religião!
Com os magos, aproximemo-nos da gruta-estábulo de Belém para acolher e reconhecer o rei-servo que nos faz livres, que nos conduz ao melhor de nós mesmos/as, que nos leva para fora do estreito círculo dos interesses mesquinhos e dos medos disfarçados. Contemplemos a glória de Deus que brilha nas suas criaturas e deixemos aos seus pés nossos melhores dons: o desejo de uma humanidade tecida de infinitos gestos de aproximação e de solidariedade, inclusive entre quem não pertence à mesma religião ou à mesma nação.
Homens de outros pagos e diferentes crenças, os magos chegam a Jerusalém vindos do oriente, guiados por um sinal que brilha no firmamento. Mateus nos diz que eles batem às portas dos chefes políticos e dos líderes religiosos pedindo ajuda para decifrar os sinais e descobrir o caminho. Os escribas mostram saber, mas são incapazes de se mover. Herodes fica sabendo das coisas e é assaltado pelo medo de perder o poder. Os magos aprendem e ensinam que Aquele que merece honra e reverência não está nos palácios, nem nas capitais...
Por mais que o profeta a elogie, Belém está entre as cidades mais insignificantes de Judá. Somente a teimosia e a fé dos pobres podem esperar algo de um lugar tão insignificante. Pois é em direção a Belém que os magos seguem, e é lá que encontram a inocente alegria com feições de um menino, deitado numa manjedoura, sob o olhar cuidadoso de uma mãe. Como os magos, sábios estrangeiros e pagãos mal-vistos, somos chamados a redescobrir nossa fé original em lugares egrupos humanos que tomam distância do terrível vírus do poder.
O Pe. Berthier observa que o mesmo fato que faz a alegria dos magos provoca também o medo de Herodes. O que motiva a viagem dos magos coloca em alerta a capital e a classe dirigente de um pobre país dominado. Mas nada desencoraja estes peregrinos da fé: nem a indiferença dos líderes religiosos, nem o medo do rei submisso ao império, nem o paradoxo da estrebaria. Que prova para uma fé pouco robusta!... Mas eles compreenderam que aquela era a morada mais adequada para quem vinha para abater os poderosos e elevar os humildes.
Herodes aconselhara que os buscadores estrangeiros fossem a Belém e voltassem trazendo-lhe preciosas informações. Mas eles caminhavam levando presentes, e não cadernos de anotações... A estrela-sinal cumpre seu papel transitório, mas o sinal de que a humanidade tem um novo líder é o “menino deitado na manjedoura”. Os magos reconhecem a realeza de Jesus Menino e lhe oferecem ouro. Proclamam sua divindade oferecendo-lhe incenso. Mas também prenunciam sua morte, que seria desde cedo tramada nos corredores dos palácios, oferecendo-lhe mirra.
Este é o núcleo da fé que professamos: um Deus que se sente bem assumindo a carne humana e que, por amor, não recusa a cruz. Como é possível que tenhamos nos afastado tão perigosamente disso? Como entender que as igrejas tenham transformado a estrebaria em palácios, os sábios estrangeiros em reis que barram migrantes, os pastores em imperadores? Como é possível que tenhamos “descafeinado” uma fé tão revolucionária, reduzindo-a a uma espécie de analgésico para as dores de uma má consciência?
Paulo fala de um mistério até então desconhecido e finalmente a ele revelado: que todos os povos e religiões particpam da mesma herança do Reino de Deus e são membros do corpo de Cristo em igual dignidade com os judeus. Com isso, Paulo derruba todos os muros que separam  e hierarquizam, atraindo também a raiva de muitos compatriotas. Em nome de Deus, ele nega toda superioridade religiosa. Na raiz da nossa fé está esta alegre descoberta da igualdade, sem privilégios.
É a ti que nos voltamos, Deus dos humildes, Deus envolto em fraldas, destino e refúgio de todos os que peregrinam nas estradas de um mundo desigual. Dá-nos palavras e sinais que guiem nossos passos inseguros no rumo certo. Não deixes, bom Deus, que tua Igreja se detenha nos palácios, que quase sempre escondem prisões. Ajuda-nos a reconhecer tua presença na Belém de todos os homens e mulheres e a ver as diversas religiões como diferentes caminhos que conduzem ao encontro contigo. E ensina-nos caminhos novos, que nos levem a um mundo novo. Assim seja! Amém!


Pe. Itacir Brassiani msf

(Isaías 60,1-6 * Salmo 71 (72) * Carta aos Efésios 3,2-6 * Mateus 2,1-12)

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