segunda-feira, 14 de abril de 2014

Sexta-feira Santa - Paixao e morte de Jesus Cristo (Ano A - 2014)

Você também quer ser discípulo deste homem?
O comércio não sabe o que fazer com esta sexta-feira, e um clima estranho envolve as pessoas em geral, mesmo os não-cristãos. Tudo é diferente, inclusive a liturgia... Nesta sexta-feira se revela o que há de mais profundo no ser humano e de mais belo no coração de Deus. E o mistério do mal também atinge sua força mais terrível, a humanização de Deus atinge seu ponto mais luminoso, a entrega do ser humano a Deus se expressa em seu grau máximo. E o serviço a Deus brilha na entrega despojada e solidária a serviço do ser humano despojado de poder e de honra.
Quem faz dos próprios interesses e ambições um ídolo intocável, cedo ou tarde acaba identificando como diabólicas e ameaçadoras todas as pessoas, grupos ou movimentos que pensam diferente e propõem uma ordem alternativa. E cria estratégias para eliminá-los sem sujar as mãos, dentro dos quadros da lei, sem se tornar impuro. Quantas leis – escritas nos códigos ou na alma dos povos – não passam de artifícios para disfarçar o domínio e a violência dos mais fortes sobre os mais fracos, tentativas de impedir que estes vivam plenamente?
Conhecemos as tramas, traições e intrigas que levaram à prisão, condenação, tortura e morte de Jesus. São opções e atitudes que revelam o mistério do mal e sua força nas pessoas e estruturas. Um mal nada abstrato, que se expressa nos costumes, nas leis, nos sistemas econômicos, nos medos, em todas as formas de ambição. Um mal que assume feições de cinismo, como quando as autoridades religiosas, tendo decidido matar Jesus, não entram no palácio do governador para não se tornarem impuras. As ditaduras de todos os quadrantes criam leis iníquas que as justificam e purificam.
É o mistério inexplicável da iniqüidade que faz com que a noite nos envolva às três horas da tarde. Uma iniqüidade que começa não se sabe bem onde e se expressa na afirmação de nós mesmos às custas dos outros, no desprezo de quem é diferente, no fechamento a toda e qualquer mudança, no uso do poder cultural e religioso para abusar de menores, na indiferença para com as vítimas, enfim: na defesa da ordem que protege os dominadores. Descrevendo este dinamismo maldito que nos envolve e fere, o salmista diz: “Eis que na culpa fui gerado, no pecado minha mãe me concebeu.”
Jesus não parece disposto a se debater e se defender. Ele tem consciência de que nasceu e veio ao mundo para tornar palpável e digno de crédito o amor fiel de Deus pelas pessoas negadas em sua dignidade. Pilatos manda torturá-lo, transforma-o numa paródia de líder e o apresenta ao povo: “Eis o homem!” E Pilatos diz a verdade, pois a verdadeira humanidade não se mostra naqueles que traficam pessoas como mercadorias ou fecham os olhos e lavam as mãos diante deste flagelo, mas nas vítimas destes atos irracionais e nas pessoas que contra eles se levantam.
Fixemos o olhar em Jesus de Nazaré, este personagem que realizou em grau pleno a vocação de todo ser humano. A criatura humana não é chamada apenas a sofrer e padecer! Em Jesus descobrimos que a pessoa humana atinge sua plenitude quando não recua diante do chamado a dar a vida, quando não abre mão da solidariedade com as pessoas negadas em sua verdade e em sua dignidade... O ser humano maduro não é o amigo de César, não é quem age sem autonomia nem liberdade e que ordena por medo... Maduro é quem, como Jesus, é capaz de se compadecer de quem é mais frágil...
A pergunta “a quem procurais?” é dirigida por Jesus também a nós. O que esperamos e o que buscamos na celebração da paixão de Jesus? Consolação nos sofrimentos inexplicáveis? Confirmação dos nossos interesses e projetos? Aqui só é licito buscar forças para perseverar no seguimento de Jesus, amigo da humanidade. Só podem beijar seu corpo torturado aqueles que estão dispostos a renascer como uma nova família, não mais presa aos laços de sangue ou aos interesses mesquinhos, mas servidora e aberta a todos os humanos seres que querem viver e promover a vida.
Deus Pai e Mãe, prostrados e agradecidos diante do supremo gesto de amor do teu Filho, te pedimos: ensina-nos a morrer para a indiferença que se globalizou e mata tantos seres humanos. Ensina-nos a deixar que Cristo viva em nós.  Ajuda-nos a assumir as conseqüências de sermos discípulos deste verdadeiro homem, e dá-nos a generosa coragem de transformar a Igreja, a sociedade e a história com o fermento da compaixão, única possibilidade de salvação do homem e do mundo. Assim seja! Amem!

Pe. Itacir Brassiani msf
(Profeta Isaías 52,13-53,12 * Salmo 30 (31) *  Carta aos Hebreus 4,14-15; 5,7-9 * João 8,1-19,42)

Nenhum comentário: