Ódio, preconceito e fanatismo que infestam Europa,
germinam também no Brasil
germinam também no Brasil
Costumamos olhar para tragédias como a que ceifou 12 vidas na
cosmopolita Paris com um misto de alívio e distanciamento. Ao longo da vida,
todos já ouviram e/ou proferiram a teoria de que “pelo menos não temos esse
tipo de problema, no Brasil”. Será mesmo?
Passeando pelas análises publicadas pela imprensa, pelas redes sociais e
pela blogosfera brasileiras sobre o episódio Charlie Hebdo, pode-se extrair
algumas conclusões básicas, necessárias a esta análise:
1 – A revista Charlie Hebdo, se não é de “extrema-esquerda”, ao menos é
esquerdista.
2 – Apesar de “esquerdista”, a revista fustiga o Islã, cujo maior
inimigo, atualmente, é a extrema-direita, inclusive a francesa, que quer
expulsar os muçulmanos da França enquanto alardeia uma ridícula “islamização do
Ocidente”.
3 – Apesar de as vítimas dos dois (?) fanáticos (pseudo) islâmicos serem
esquerdistas, o atentado está favorecendo a extrema-direita europeia, talvez
porque o anti-islamismo da revista se identifica com o da ultradireita
francesa.
4 – Muçulmanos de várias nacionalidades que hoje vivem na Europa
acabam de se tornar alvos em potencial do extremismo xenófobo de direita que se
agiganta no Velho Mundo – na França, por exemplo, Marine Le Pen, filha do líder
de ultradireita Jean Marie Le Pen, da Frente Nacional (FN), lidera (!!) as
pesquisas para a sucessão de François Hollande.
5 – Apesar de a Europa abrigar uma imensa população muçulmana, essa
população vive acuada pelo ódio, pelo preconceito e pela intolerância de grande
parte das populações europeias autóctones.
Foi justamente no continente europeu que eclodiram as piores guerras da
era moderna, sendo, duas delas, guerras “mundiais”. E essas guerras que
conflagraram as nações supostamente mais avançadas (socialmente) do planeta
decorreram, em boa medida, da intolerância étnico-cultural-religiosa.
Desloquemo-nos, agora, milhares de milhas ao Sul do
planeta, até uma nação imensa e ainda mais multiétnica do que as nações
europeias. Uma nação onde o fascismo de ultradireita entrou em ascensão após os
protestos tresloucados de junho de 2013.
O Brasil tem seus “muçulmanos”, ou seja, uma
população “imigrante” e “estrangeira” em seu próprio país. O ódio aos
nordestinos que viceja no Sul e no Sudeste do Brasil em muito se assemelha ao
que vige contra muçulmanos na Europa.
A intolerância política, “racial”, cultural contra
os nordestinos, assim como na Europa, vai crescendo também no Brasil, inclusive
com outro ingrediente explosivo, a religião. Ainda que não tenhamos
discriminação de religiões, no Brasil temos religiões que discriminam
comportamentos e opções políticas. Claro que ainda não chegamos ao ponto de graves
confrontos físicos. Por conta disso, o título deste texto alude a que essas
infestações ideológicas apenas “germinam” por aqui, mas germinam continuamente.
Grupos
de ultradireita pregam o fim da democracia, proibição de partidos políticos,
assassinatos e tortura de esquerdistas, repressão violenta a homossexuais,
impunidade ao racismo etc., etc., etc. Esse tipo de gente já foi minoria na
Europa central moderna. Hoje, o mundo assiste, com preocupação, a possibilidade
de a França eleger, para a sucessão de François Hollande, a filha de Jean Marie
Le Pen…
O
horror, o horror! O ataque ao semanário Charlie Hebdo também providencia uma
segunda reflexão: o papel da imprensa no aquecimento do ódio, do preconceito e
do fanatismo. O poder da comunicação, acima de políticas de Estado, gerou a
tragédia em Paris. No Brasil, a comunicação tem sido responsável pelo
recrudescimento do ódio político-ideológico.
Blog da Cidadania 10/01/2015
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