Um outro mundo é
possível: acreditemos nessa boa notícia!
Há quinze
anos o Fórum Social Mundial nascia
como um grito visceralmente evangélico: ‘Um outro mundo é possível’. E desde
então o mundo não é mais o mesmo! As vozes e as mãos que anunciam e tecem
alternativas se uniram, e o ‘mundo de Davos’, a contra-gosto, reconheceu que
outras coisas estavam querendo nascer. Como não ver nesse grande laboratório de alternativas um eco
daquilo que aconteceu às margens do mar da Galiléia, dois mil anos antes? As
palavras são outras, mas a perspectiva é a mesma: “O Reino de Deus está
próximo! Convertam-se e acreditem nessa boa notícia!”
A
primeira palavra que sai da boca de Jesus, o anúncio que resume sua pessoa e
sua missão é: “O tempo se cumpriu: o Reino de Deus está próximo!” Ao lançar mão
dessas palavras, Jesus sabia da força que tinham no imaginário do seu povo. Com
o conceito “Reino de Deus”, os profetas anunciavam o início de um novo céu e uma nova terra, o começo
de uma nova sociedade, na qual idosos
e crianças, trabalhadores do campo e da cidade, teriam lugar e seriam tratados
como gente (cf. Is 65,17-25; Zc 8,1-23). O Reino de Deus era uma louca esperança
que os profetas se encarregavam de mater viva.
Nos
tempos de êxito ou de fracasso político-insitucional essa esperança quase
desaparece, sufocada pela ânsia de poder ou desmentida pela dura realidade. Mas
sua semente promissora é teimosa e sempre cuidadosamente guardada e cultivada
pelos pobres de Deus e seus aliados, por aqueles que esperam o ‘Dia do Senhor’.
Mas, na boca de Jesus, este anúncio do Reino de Deus tem duas novidades: ele desloca o tempo do futuro para o presente; e
estabelece cada pessoa humana como seu protagonista. Para ele, o tempo de espera terminou, e o Reino está próximo, batendo à porta, é
iminente.
Por outro
lado, mesmo mantendo o princípio de que o reino é de Deus, Jesus não atribui
sua realização exclusivamente a Deus ou a si mesmo. Certo, ele tem o papel de
protagonsita, mas também associa a si homens e mulheres que levam o Reino de
Deus adiante. O Reino é tanto mais de
Deus quanto mais tiver como protagonistas homens e mulheres comuns, livres e
libertadores, despojados e solidários. É na ação de libertar que as pessoas
se tornam livres e que Deus reina. É por isso que, depois de fazer ressoar seu
anúncio e de pedir o engajamento dos seus ouvintes, Jesus chama os primeiros
discípulos.
O
pré-requisito do chamado é a conversão, a ruptura com amentalidade segundo a
qual o mundo não tem jeito, a opressão sempre existiu e sempre existirá, a fé
não tem nada a ver com a política, e assim por diante... Para acreditar que um outro mundo é possível, é nessário mudar
os esquemas mentais, converter-se. Acolher o Reino de Deus e entrar na sua
lógica é uma decisão que exige rupturas, e a primeira é com a segurança
econômica. Por mais humilde e suspeito que fosse, o ofício de pescador oferecia
uma certa segurança econômica, e os discípulos tiveram que começar rompendo com
isso...
Jesus vê
Simão, André, Tiago e João e os convida a caminhar com ele, a serem discípulos
e aprendizes. Mas, para isso, eles precisam romper também com a segurança
social representada pela família. Deixando o pai, eles rompem com um modelo de
família centrado na figura e no poder masculinos, e se abrem a novas relações,
menos piramidais e mais fraternas. E, rompendo com a ordem sócio-econômica
dominante, os discípulos entram na escola de Jesus e começam a assimilar um
novo pensar e um novo agir. Em linguagem de hoje, os discípulos aderem a um estilo de vida alternativo.
Aceitar o
convite e seguir Jesus é uma decisão inteligente e exigente. Inteligente, porque supõe discernimento
sobre o caminho da realização pessoal e da libertação social. Exigente, porque implica em deixar o
cômodo mundo privado e seus interesses estreitos e arriscar-se no tenso e
disputado espaço público, tomando partido em favor dos pobres e, quando
necessário, contra os poderosos e seus aliados. É isso que significa
originalmente a surpreendente expressão “pescadores de homens”. Na linguagem
profética, a pesca é o julgamento de
Deus! (cf. Jer 16,16-18; Ez 29,1-16; Am 4,1-3)
Deus pai e mãe, fonte e destino dos nossos
sonhos! Ajuda-nos a perceber com alegria que tudo câmbia, e que um outro mundo
está nascendo nas mil ações dos discípulos e discípulas do teu Filho. Abre e
cura nossos ouvidos, para que escutemos e acolhamos a Boa Notícia da proximidade
do teu Reino. Envia sobre nós o teu Espírito, para que ele mude nossos rígidos
e medrosos sistemas mentais e force a ruptura com as amarras que reciclam os
poderes moribundos. E faz da tua Igreja uma comunidade de pescadores de gente, servidores
do teu juízo crítico e libertador sobre os sistemas deste mundo. Assim seja!
Amém!
Itacir Brassiani msf
(Profeta Jonas 3,1-5.10 * Salmo 24 (25) * 1ª Carta aos Coríntios 7,29-31
* Evangelho de Marcos 1,14-20)
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