quarta-feira, 7 de outubro de 2015

VIGÉSIMO-OITAVO DOMINGO DO TEMPO COMUM (ANO B – 11.10.2015)

Partilhar os bens para seguir Jesus com mais liberdade.

A fé é uma caminhada, como o é também nossa eterna luta por um mundo melhor. É uma caminhada a pé e, por isso, quanto menos bagagem, melhor. A estrada do seguimento de Jesus, um caminho que conduz à realização mais profunda que um ser humano pode desejar, tem seu preço. Mas o caminho que nos leva ao Reino de Deus tem seu próprio pedágio, e quem assume sua missão no mundo precisa evitar a omissão e jamais pedir demissão. Longe de nos afastar das dores, tensões e buscas da história, a fé nos leva ao seu próprio coração. E isso supõe lucidez, coragem e generosidade.
O personagem anônimo apresentado pelo evangelho de hoje é paradigmático. Aparentemente não lhe falta fervor religioso: corre ao encontro de Jesus, ajoelha-se respeitosamente diante dele, chama-o de bom mestre... Mas Jesus começa jogando um pouco de água fria no fervor superficial e no orgulho oculto daquele homem. “Só Deus é bom, e ninguém mais.” Depois, remete ao conhecido caminho dos mandamentos: cita cinco sinais que proíbem passagens perigosas e uma que mostra a direção obrigatória. O candidato a discípulo responde, muito seguro de si: “Mestre, desde jovem tenho observado todas essas coisas.” Refratário às estradas, ele sempre frequentara os genuflexórios...
Para este homem piedoso e rico, a fé não é um caminho a ser percorrido, mas um porto seguro e já alcançado, uma aquisição garantida pela moeda da piedade superficial e das leis mesquinhas, centrada nos próprios méritos e indiferente à sorte dos outros. Nem mesmo a referência que Jesus faz ao mandamento de não roubar consegue inquietá-lo. É a típica pessoa de consciência absolutamente tranquila, imperturbável. Seu único desejo é ser reconhecido e aplaudido como bom e irreprensível. Mas Jesus entra como um terremoto no tranquilo status deste postulante à santidade.
O amor de Jesus por este homem que parece tão correto e piedoso não o impede de perceber uma grande lacuna: “Falta só uma coisa para você fazer: vá, venda tudo, dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me.” Para Jesus, as práticas de piedade e o cumprimento dos mandamentos não atingem sua meta enquanto não nos abrem à partilha e à solidariedade e não nos colocam livres e nus no caminho da cruz. Em outras palavras, a questão que Jesus coloca é a seguinte: qual é teu verdadeiro tesouro? Em que puseste tua confiança?
A reação do homem aparentemente exemplar revela o que ele considerava realmente importante: o reconhecimento público como alguém perfeito e superior ao comuns dos mortais; o capital que ele havia acumulado e que lhe conferia um poder nada desprezível numa Palestina espoliada. Pedindo que ele venda seus bens, Jesus não está propondo a pobreza como tal, como se lhe agradasse um estilo de vida pauperístico. Ele pede que os bens cumpram sua finalidade legítima: atender solidariamente as necessidades das pessoas humanas, e nada mais.
Diante das palavras de Jesus, o homem fica abatido e vai embora cheio de tristeza, porque é muito rico. Seu desejo de uma vida humanamente madura e profunda não é tão forte quanto seu amor pelos bens que acumula. Essa atitude faz Jesus murmurar desconsolado: “Como é difícil para os ricos entrar no Reino de Deus!” E acrescenta, para escândalo dos discípulos: “É mais fácil passar um camelo pelo buraco de uma agulha, do que um rico entrar no Reino de Deus!” E não adianta querer superar este escândalo diminuindo o tamanho do camelo ou aumentando as dimensões do buraco da agulha...
Apego às riquezas e seguimento de Jesus Cristo não se conjugam. Quando colocamos nossa segurança nas bens, parece-nos difícil empreender travessias. A casa das nossas honras e conquistas nos parece mais segura, e acabamos pensando que os pobres devem sair da miséria com suas próprias forças e meios, cumpir suas obrigações e deixar de exigir direitos. Vender os bens e dar o dinheiro aos pobres é apenas uma etapa, e prepara a opção decisiva: seguir Jesus no enfrentamento das armas ideológicas da morte, na missão de em tudo e sempre amar e servir. “Depois, venha e siga-me...”
Jesus de Nazaré, missionário enviado pelo Pai para nos conduzir à vida plena! Dá-nos uma mente sábia, que aprecie mais a vida que os bens e valorize mais a liberdade que os prêmios das loterias e cargos políticos. Desperta em nossas comunidades a capacidade de ler responsavelmente a história, de identificar nela os problemas, aspirações e esperanças dos pobres e oprimidios. Suscita e sustenta na tua Igreja a coragem e a liberdade feminina de Teresa de Avila, o testemunho martirial de João Bosco Penido Burnier e o sonho missionário do Pe. Berthier. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Livro da Sabedoria 7,7-11 * Salmo 89 (90) * Carta aos Hebreus 4,12-13 * Evangelho de S. Marcos 10,17-30)

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