quarta-feira, 30 de março de 2016

ANO C – SEGUNDO DOMINGO DA PÁSCOA – 03.04.2016

Do encontro com Jesus ressuscitado, brota nossa missão.

A provocadora luz da ressurreição de Jesus normalmente não brilha de forma repentina e poderosa na vida dos cristãos. Ela vai se acendendo aos poucos... Naquela noite do primeiro dia da semana, as portas da sala, onde se encontravam os discípulos desiludidos e assustados, estavam firmemente trancadas. O ambiente externo era hostil e aquele punhado de sonhadores cheios de ambiguidades sentia-se desamparado. A lembrança da traição de Jesus por um deles, da negação pública de um dos principais e da deserção de quase todos doía e envergonhava. Era noite por fora e por dentro, e nem mesmo a Boa Notícia anunciada por Maria Madalena conseguira arrancá-los daquela prostração.
Este ambiente noturno e fechado contrasta com a manhã luminosa e aberta na qual Maria Madalena se encontrara com Jesus ressuscitado (cf. Jo 20,1-18). Os discípulos vivem a mesma sensação de escuridão e ameaça que haviam experimentado ao atravessar o lago, depois da tentativa frustrada de transformar Jesus em rei (cf. Jo 6,16-21). Mas as trevas da noite costumam ser proporcionais à luz da aurora que se esconde no seu ventre, como aquela noite na qual Deus fez vigília e iniciou a libertação do povo do Egito (cf. Ex 12,42; Dt 16,1), e como em tantas outras noites da história da humanidade.
Superando todos os obstáculos, Jesus irrompe no meio dos discípulos, e não o faz para advertir e acusar. Os discípulos se alegram quando Jesus, mostrando-lhes as mãos e o lado, se apresenta como Cordeiro com o qual se inicia a festa do êxodo libertador. Ele faz questão de mostrar as mãos nas quais o Pai tinha posto tudo (cf. Jo 13,3); as mãos que realizaram as ações libertadoras de Deus (cf. Jo 3,36); as mãos firmes das quais nenhuma ovelha pode ser arrancada (cf. Jo 10,28). Estas mãos perfuradas simbolizam a historicidade e a concretude humana da sua presença na comunidade de fé.
Mas Jesus quer, porém, evitar a tentação de uma paz que consola e acomoda. Como Deus havia feito no início da criação, Jesus transmite seu Sopro aos discípulos e os constitui agentes vivificadores, sinais e instrumentos de uma nova criação. “Então soprou sobre eles e falou: ‘Recebei o Espírito Santo’.” Assim, a experiência pascal é êxodo corajoso e libertador de todos os fechamentos e redis para prosseguir o caminho trilhado por Jesus. Não encontraremos nem conheceremos verdadeiramente Jesus Cristo ressuscitado enquanto não estivermos situados num horizonte de esperança e de ação missionaria.
Somos enviados como ele foi enviado pelo Pai, como Cordeiros que carregam o pecado do mundo, pois perdoar é libertar uma pessoa de um peso que prende e impede de viver plenamente, como Jesus fizera com a mulher samaritana (cf. Jo 4,1-42), com o homem que sofria há 38 anos (cf. Jo 5,1-18), com a mulher acusada de adultério (cf. Jo 8,1-11), com o cego de nascença (cf. Jo 9,1-41). Conduzidos e fortalecidos pelo Espírito de Jesus, somos enviados para construir uma comunidade de homens e mulheres que procuram romper com o espírito do mundo e tomar distância das estruturas de pecado.
A primeira expressão da missão que brota da experiência pascal é o testemunho de vida fraterna e solidária, diante do qual a sociedade é obrigada a tomar posição. E a segunda é, como nos mostra João evangelista, o anúncio de que isso é feito em nome de Jesus, “o primeiro e o último, Aquele que vive”, a pedra rejeitada pelos construtores e escolhida por Deus como pedra principal. É em Jesus que se fundamenta nosso novo viver e nossa irrenunciável missão. Mas desde sempre, como nos mostra Pedro, a missão dos cristãos é também ação transformadora: todos os que se aproximavam dele eram curados.
Hoje a missão continua, e vai sendo tecida pelos fios do testemunho, do diálogo, do anúncio e o serviço que defende e promove a vida. Partindo do encontro com o Ressuscitado, o anúncio e o testemunho são vividos não apenas no cuidado dos doentes, mas também nas diversas iniciativas e cuidados pastorais em favor das crianças, dos encarcerados, dos migrantes, dos operários, da mulher marginalizada, da juventude, da terra, da família, do ambiente, nossa casa comum. As pessoas têm o direito de sentir em nós a mão do próprio Jesus Cristo tocando seus ombros cansados e espantando o medo!
Jesus de Nazaré, Cordeiro de Deus, o último num mundo obcecado pelo poder e o primeiro no Reino de Deus... Na mesa da tua Palavra e do teu Corpo somos nutridos e encorajados a partir em missão e tirar o pecado do mundo, amar e servir incondicionalmente. E o faremos tornando-nos uma bênção que de mil formas toca, desperta, cura, liberta. Não permitas que, como ocorreu com Tomé, nos separemos do corpo eclesial e, assim, sejamos incapazes de te reconhecer vivo entre nós. E dá-nos a graça de crer em ti apoiando-nos no testemunho daqueles que provaram teu amor e tocaram tuas chagas. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 5,12-16 * Salmo 117 (118) * Apocalipse 1,9-13.17-19 3,1-4 * Evangelho de João 20,19-31)

quinta-feira, 24 de março de 2016

Cristo vive!... Onde?!

ONDE PROCURAR O QUE VIVE?

A fé em Jesus, ressuscitado pelo Pai, não brotou de forma natural e espontânea no coração dos discípulos. Antes de encontrar-se com Ele, cheio de vida, os evangelistas falam da sua desorientação, da sua busca em torno do sepulcro, as suas interrogações e incertezas.
Maria de Magdala é o melhor protótipo do que acontece provavelmente a todos. Segundo o relato de João, procura o crucificado no meio das trevas, «quando ainda estava escuro». Como é natural, procura-O «no sepulcro». Todavia não sabe que a morte foi vencida. Por isso, o vazio do sepulcro deixa-a desconcertada. Sem Jesus, sente-se perdida.
Os outros evangelistas recolhem outra tradição que descreve a procura de todo o grupo de mulheres. Não podem esquecer o Mestre que as acolheu como discípulas: o seu amor leva-as ao sepulcro. Não encontram ali, a Jesus, mas escutam a mensagem que lhes indica para onde devem orientar a sua busca: «Porque procurais entre os mortos aquele que vive? Não está aqui. Ressuscitou».
A fé em Cristo ressuscitado não nasce tampouco hoje em nós de forma espontânea, apenas porque o escutamos desde crianças, a catequistas e pregadores. Para nos abrirmos à fé na ressurreição de Jesus, temos de fazer o nosso próprio percurso. É decisivo não esquecer Jesus, amá-lo com paixão e procurá-lo com todas as nossas forças, mas não no mundo dos mortos. Ao que vive há que procura-lo onde há vida.
Se queremos encontrar-nos com Cristo ressuscitado, cheio de vida e de força criadora, temos de o procurar, não numa religião morta, reduzida ao cumprimento e à observância externa de leis e normas, mas ali onde se vive segundo o Espírito de Jesus, acolhido com fé, com amor e com responsabilidade pelos seus seguidores.
Temos de o procurar, não entre os cristãos divididos e confrontando-se em lutas estéreis, ocas de amor a Jesus e de paixão pelo Evangelho, mas ali onde vamos construindo comunidades que colocam Cristo no seu centro porque, sabem que «onde estão reunidos dois ou três em seu nome, ali está Ele».
Ao que vive não o encontraremos numa fé estancada e rotineira, gasta por todo tipo de frases e fórmulas vazias de experiência, mas procurando uma qualidade nova na nossa relação com Ele e na nossa identificação com o seu projeto. Um Jesus apagado e inerte, que não apaixona nem seduz, que não toca os corações nem contagia a sua liberdade, é um «Jesus morto». Não é um Cristo vivo, ressuscitado pelo Pai. Não é o que vive e faz viver.
José Antonio Pagola

Um salvador crucificado?

Messias Crucificado? Que loucura!
A vida de Jesus, suas ações e ensinamentos extrapolaram o senso comum dos seus contemporâneos. Suas chocantes parábolas quebravam a lógica dos sacerdotes e doutores da Lei, faziam pensar, provocavam mudança, geravam resistências. Seu projeto de “mesa comum” era um paradoxo para a visão legalista da religião do seu tempo.
Em vez de preocupar-se com o cumprimento da “lei da pureza” (Lv 11-16), que excluía e discriminava pessoas como impuras, Jesus proporciona a experiência sagrada da comensalidade aberta. Homens e mulheres de diferentes posições sociais e situações pessoais podiam sentar-se juntos e compartilhar o pão. Esta é uma característica fundamental do Reinado de Deus anunciado e vivenciado na prática de Jesus.
Este inédito ministério de Jesus durou pouco. Somente uns três anos, pois desde o início encontrou uma grande oposição do sistema do templo, que se uniu ao poder civil e conseguiu prender Jesus, torturá-lo e crucificá-lo. Mas, Deus o ressuscitou, o levantou da morte, confirmando seu Projeto! A experiência da ressurreição congrega, na Galileia, os discípulos que se haviam dispersado, depois do aparente fracasso da Cruz. Surpreendentemente, a voz para esta articulação era das mulheres (Mc 16,7; Mt 28,8). Com certeza, foi um recomeçar muito tímido e modesto, este, da comunidade da Galileia.
A Cruz não tem lógica, nem pode ser explicada! 
Cerca de seis anos mais tarde, Saulo entra em contato com a Boa Nova de Jesus, o Nazareu (At 6,14), através da pregação e do testemunho de Estevão, que transbordante de sabedoria e dom do Espírito (At 6,10), dava continuidade ao movimento iniciado por Jesus de Nazaré. Paulo observava o martírio de Estevão, porém ainda estava preso à lógica do discurso religioso oficial e não se deixou tocar pelo paradoxo de um Messias Crucificado, de um amor que não se poupa, de uma gratuidade que se dá totalmente, na liberdade escolhida.

No caminho para Damasco, inicia-se em Saulo um processo de conversão que durou anos. O clímax deste processo acontece na sua dolorosa experiência de fracasso em Atenas. Foi uma profunda experiência de rejeição por parte dos gregos que levou Paulo a resgatar com insistência e convicção a mensagem do Messias Crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos (1Cor 1,23). Mas, que experiência foi essa? Em Atenas, depois de percorrer a cidade e observar aspectos importantes da cultura grega, Paulo preparou com muito cuidado um discurso. Preocupado em gerar um debate que levasse ao conhecimento da boa-nova de Jesus, Paulo elaborou sua fala a partir das regras de retórica dos gregos (At 17,22-31). Mas, não falou da Cruz. Falou somente de Jesus e da sua ressurreição. Para os gregos, que já tinham tantos casais de deuses, o anúncio de Jesus e sua anástasis (ressurreição) não trazia nenhuma novidade! Disseram-lhe: “Até logo! Nós ouviremos você falar disso em outra ocasião!” (At 17,32). Decepcionado, Paulo descobriu que não se pode falar de ressurreição sem falar da Cruz. Descobriu também que a Cruz não tem lógica, nem existem discursos capazes de explicá-la! (At 17,33).
Depois dessa experiência, Paulo seguiu para Corinto e ficou um tempo sem pregar, trabalhando como artesão, junto com Priscila e Áquila (At 18,1-4). Ele deve ter aprendido muito com esta experiência de fracasso, porque faz memória das marcas que ficaram em seu corpo e em seu estilo de pregação: “Quando fui me encontrar com vocês, irmãos, não me apresentei com o prestígio da palavra ou da sabedoria para anunciar-lhes o mistério de Deus. Eu não quis saber de outra coisa, entre vocês, do que de Jesus Cristo, e Jesus Crucificado. Estive cheio de fraqueza, receio e tremor entre vocês. Minha pregação nada tinha da linguagem persuasiva da sabedoria, mas era uma demonstração de Espírito e poder…” (1Cor 2,1-5).
Uma comunidade imatura e dividida. 
Mais tarde, estando já em Éfeso, Paulo ficou sabendo que a comunidade de Corinto estava dividida, que gostavam de ouvir discursos bem elaborados e que fãs dos evangelizadores formavam grupos rivais: “Eu sou de Paulo!”, ou “Eu sou de Apolo!”, ou “Eu sou de Cefas!”, ou “Eu sou de Cristo!” (1Cor 1,12). Sofrendo, Paulo escreveu uma carta para esta comunidade ainda tão imatura, buscando mostrar a diferença entre a sabedoria do mundo e a sabedoria da Cruz, sem ignorar a sabedoria humana, mas apresentando-a como dom de Deus (1Cor 1,21).
Agora, Paulo foca sua pregação na loucura da Cruz, que é loucura de Deus (1Cor 1,25). E a loucura de Deus é expressão do seu amor sem limites, manifestado na humanidade plena do Messias Crucificado. E a loucura de Deus transparece também na fragilidade das pessoas que formam a comunidade: “Olhem para vocês mesmos, irmãos! Entre vocês não há muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de famílias importantes. Mas, o que é loucura no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios. E o que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte…” (1Cor 1,26-31). Para a visão do mundo, a paixão pelo Reino é uma loucura.
Hoje, quanto mais nos aproximamos de Jesus, através dos Evangelhos, mais percebemos a paixão que o levou a viver intensamente, descuidado de si, apaixonadamente entregue ao projeto do Pai, dedicando sua vida ao serviço dos pequeninos, das pessoas pobres e discriminadas, excluídas do acesso direto a Deus, pelo sistema do templo. Uma entrega tão intensa que ele nem encontrava tempo para comer. Seus familiares e amigos chegaram a pensar que ele havia ficado louco: “Quando os seus tomaram conhecimento disso, saíram para detê-lo, porque diziam: ‘perdeu o juízo’” (Mc 3,20-21).
Jesus ama sem medida, é sensível ao sofrimento e deixa-se tocar pela dor das pessoas, sobretudo das mais frágeis. Ao se encontrar com a viúva que ia enterrar o seu filho único, Jesus ama aquela mulher desconhecida: “Mulher, não chores!” Quem ama como Jesus, vive aliviando o sofrimento e secando lágrimas.
Jesus olhava para a multidão e comovia-se: via seu povo sofrendo, desorientado como ovelhas sem pastor. Rapidamente, punha-se a curar os mais doentes ou a alimentá-los com as suas palavras. Quem ama como Jesus, aprende a olhar os rostos das pessoas com compaixão. Está sempre disponível. Não pensa em si mesmo. Atende qualquer chamado, toda solicitação, disposto sempre a fazer algo pela pessoa. Acolhe o mendigo cego, que grita e irrita a todos: “Que queres que faça por ti?” Com esta atitude anda pela vida quem ama como Jesus.
Jesus sabe estar junto aos mais desvalidos. Nem mesmo espera que lhe peçam. Cura doentes, liberta consciências, contagia de amor e confiança em Deus. Mas não pode resolver todos os problemas daquelas pessoas. Então, dedica-se a fazer gestos de bondade. Abraça as crianças da rua: não quer que ninguém se sinta órfão. Abençoa os doentes: não quer que se sintam esquecidos por Deus. Acaricia a pele dos leprosos: não quer que se vejam excluídos. Assim são os gestos de quem ama como Jesus. Esta é a loucura que confunde o mundo!
Carlos Mesters e Mercedes Lopes


ANO B – TRÍDUO PSCAL: DOMINGO DA PÁSCOA – 27.03.2016

Em Jesus, a sepultura é transformada em sementeira de vida!

Chegamos à festa que preparamos com tanto empenho nas últimas seis semanas. Trazemos a memória agradecida da aliança realizada na última ceia e nas muitas e solidárias ceias penúltimas. Trazemos nos olhos o sinal luminoso das mãos perfuradas e dos braços abertos em forma de cruz, prontos a abraçar a humanidade inteira. Partilhamos com Madalena o vazio de uma ausência querida. Trazemos na mente e no ventre o trabalho das mulheres e homens, comunidades e movimentos que, no escuro da noite, prepararam tecidos e perfumes para cuidar da casa comum e não permitir que a vida se perca.
A Páscoa celebra o reconhecimento de Jesus – o profeta perseguido e assassinado, o irmão e servidor da humanidade – como Filho de Deus. Proclama que nele Deus vence todas as formas de morte, desde a morte física até a morte progressiva e massiva que resulta das estruturas iníquas e dos poderes despóticos. Anuncia que Jesus, considerado uma pedra sem utilidade e problemática na manutenção do mundo, é por Deus reconhecido e apresentado como pedra fundamental da construção de um mundo novo. Afirma que nossa esperança, embora ainda dance na corda bamba, é teimosa e tem futuro.
A Páscoa de Jesus de Nazaré e dos cristãos celebra as milhares de possibilidades escondidas na vida de cada pessoa e da humanidade. Afirma que a última palavra não será sempre do discurso frio daqueles que impõem sua injusta ordem, lincham midiaticamente os líderes populares e mandam calar os profetas. Proclama que a ação realmente eficaz e grávida de futuro é aquela que estabelece a absoluta superioridade do outro necessitado. Evidencia que a direção certa e o sentido da vida está no cuidado da terra, no fazer-se semente de um mundo outro e de uma outra vida, tão possível quanto urgente.
Ademais, a ressurreição não é algo que se manifesta apenas depois da morte. Paulo nos surpreende afirmando que os cristãos já foram ressuscitados! Ele se refere ao dinamismo pascal do nosso batismo, que possibilita e pede a passagem de uma vida individualista a uma vida plena e solidária. “Procurem as coisas do alto”, exorta Paulo. E isso significa assumir um estilo de vida centrado no amor, no serviço e na partilha, na busca de uma segurança que tenha a justiça como mãe. O pecado ainda não perdeu totalmente sua influência, mas está mortalmente ferido, e não domina mais sobre nós.
É verdade que a ressurreição de Jesus não é algo que se impõe com força de evidência, não vem acompanhada de manifestações potentes. O dia já havia amanhecido, mas, na cabeça de Maria Madalena e dos apóstolos a experiência do fracasso pairava como escuridão. Só muito lentamente eles foram percebendo que os lençóis estendidos não estavam lá para cobrir um morto mas para acolher as núpcias de uma nova aliança de Deus com a humanidade. O sudário sim, depois de ter coberto a cabeça de Jesus, agora estava à parte e envolvia totalmente o templo, o lugar onde a morte fora tramada e decretada.
Lembremos que a Páscoa de Jesus de Nazaré inaugura uma Nova Criação. Ressucitando e trazendo no corpo as feridas dos pregos e da lança, ele é o Homem Novo, o Novo Adão, o Irmão primogênito e solidário de todos os homens e mulheres. Os discípulos e discípulas se reúnem em torno da sua memória e organizam comunidades que continuam seu sonho e seu caminho. E as pessoas acolhidas nestas comunidades estabelecem vínculos que formam um Novo Povo de Deus, a comunhão dos grupos e movimentos de cuidadores e servidores, de gente que luta por vida abundante para todos.
Na entusiasmada catequese que desenvolve na manhã de pentecostes, Pedro sublinha que Jesus andou por toda parte fazendo o bem e agindo sem medo, apesar da violência que havia levado João Batista à morte. Enfatiza que Deus estava com ele, inclusive no vazio escuro da cruz, quando parecia havê-lo abandonado. Ensina que Deus o ressuscitou dos mortos, e transformou em juiz aquele que fora réu. E lembra que os discípulos e discípulas, apesar da dificuldade de acreditar nele e da permanente tentação de abandoná-lo, são constituídos testemunhas e pregadores dessa Boa Notícia. Ora, essa é uma notícia tão boa e tão nova que, para acolhê-la, precisamos de uma profunda mudança de mentalidade.
Jesus de Nazaré, filho amado de Deus, irmão querido da humanidade! Aqui estamos reunidos para celebrar contigo a festa dos pequenos, daqueles que se desvelam no cuidado da casa comum. É uma festa que não serve os bens roubados aos fracos e não ostenta a indiferença de quem esquece a continuidade da luta. O mistério da vida ressuscitada se dissemina discretamente em tantas pessoas e grupos, inclusive naqueles que não te reconhecem explicitamente. Por isso, celebramos nossa páscoa na tua páscoa, e saímos apressados a testemunhar que a vida é mais forte que a morte e que o amor é imortal. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 10,34-43 * Salmo 117 (118) * Carta aos Colossenses 3,1-4 * Evangelho de João 20,1-9)

quarta-feira, 23 de março de 2016

A pascoa de Jesus

Morte e Ressurreição: Só ressuscita quem primeiro morre (Lucas 23,44-24,12)

Neste relato, Lucas conta como foram a morte, o enterro e a ressurreição de Jesus. Mas ele conta os fatos de tal maneira, que a gente consiga perceber a semente de esperança e de vida nova que pode nascer da crise, da dor e da morte. Na hora em que a luz bate nos olhos, tudo escurece. Na hora do parto, as dores se anunciam. Na hora da crise, o futuro se abre. Na hora da morte, a vida renasce. 
O texto descreve o que se passou desde a morte e o enterro de Jesus até a experiência da sua ressurreição. Durante a leitura vamos prestar atenção no seguinte: “Quais são, um depois do outro, os acontecimentos descritos neste texto?”
SITUANDO
Os inimigos conseguem realizar o seu projeto. Matam Jesus. Vencem, usando o poder da força bruta. Vencem, mas não convencem! Não conseguem destruir nem abafar a bondade e o amor em Jesus. Pelo contrário! Lucas mostra como Jesus, exatamente enquanto está sendo vítima do ódio e da crueldade dos homens, revela a ternura de Deus e nos dá a “suprema prova do amor!” (Jo 13,1).
Eis algumas frases de Jesus que só Lucas nos conservou e nas quais transparece a vitória da vida que a morte não conseguiu matar: “Desejei ardentemente comer esta páscoa com vocês” (22,15). “Façam isto em memória de mim!” (22,19). “Simão, rezei por você, para que não desfaleça a sua fé!” (22,32). Na hora da negação de Pedro, Jesus fixa nele o olhar, provocando o choro de arrependimento (22,61). No caminho do calvário, Jesus acolhe as mulheres: “Filhas de Jerusalém, não chorem por mim!” (23,28). Na hora de ser pregado na cruz, ele reza: “Pai, perdoa, porque não sabem o que fazem” (23,34). Ao ladrão pendurado na cruz a seu lado ele diz: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso!” (23,43). Estas frases nos dão os olhos certos para ler e saborear a descrição da morte, do enterro e da ressurreição de Jesus.
COMENTANDO
Lucas 23,44-46: A morte de Jesus
Jesus está pendurado na Cruz. A morte está chegando. Ao meio-dia, o sol escurece, as trevas invadem a terra. Estes fenômenos da natureza interpretam o significado da morte de Jesus. Simbolizam a chegada do Reino. O véu do san¬tuário rasgou-se ao meio. Terminou a vigência do Antigo Testamento, simboli¬zado pelo Templo, cujo véu separava Deus do resto do mundo. Pela sua vida, paixão, morte e ressurreição, Jesus trouxe Deus para perto de nós e revelou a sua presença em tudo que existe e acontece. Na hora de morrer, Jesus dá um forte grito. O grito do povo oprimido deu início ao primeiro êxodo (Ex 2,23-25), pois Deus escutou o grito do povo. Escuta também o grito de Jesus, fazendo com que se realize o novo êxodo. Jesus resume toda a sua vida dizendo: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Com esta frase do salmo (Sl 31,6), Jesus devolve ao Pai o Espírito que dele tinha recebido na hora do batismo (Lc 3,22). Foi na força do Espírito que Jesus iniciou a sua missão. É na força do mesmo Espírito que ele a encerra.
Lucas 23,47-48: As reações diante da morte de Jesus
Um estrangeiro, centurião do exército romano, vendo o que acontecera na hora da morte de Jesus, faz uma profissão de fé: “Realmente, este homem era um justo!” Justo é aquele que realiza o objetivo da Lei de Deus. Jesus realizou a Lei, transgredindo normas inúteis, abrindo novos caminhos e acolhendo a todos, inclusive aos pagãos. A multidão, vendo o que tinha acontecido, volta para casa batendo no peito. Reconhece o erro que cometeu pedindo a conde-nação de Jesus.
Lucas 23,49: As testemunhas da morte de Jesus
Os amigos e as mulheres que o haviam acompanhado desde a Galileia permanecem à distância, observando tudo. Testemunham que foi assim que Jesus morreu. Aqui, Lucas indica a fonte de onde recolheu parte do material que acaba de contar.
Lucas 23,50-54: O enterro de Jesus
José de Arimateia, membro do Sinédrio, que não concordara com a condenação de Jesus, cuida do enterro. Jesus é enterrado num sepulcro novo, talhado na rocha. Realiza-se, assim, outra profecia de Isaías sobre o Servo que dizia: “Seu túmulo está com os ricos” (Is 53,9: “profecia historicizada”). Lucas insiste em dizer: “Era o dia da Preparação. O sábado estava quase começando”. O sábado é o 7° dia. Estava terminando o 6° dia da nova criação. Jesus descansa no 7° dia.
Lucas 23,55-56: As mulheres, testemunhas do enterro de Jesus
As mulheres testemunham também o lugar onde foi colocado o corpo de Jesus. Havia, ali, muitos sepulcros, alguns fechados, outros abertos. Quem não soubesse bem onde Jesus havia sido enterrado poderia enganar-se. Mas elas seguem José de Arimateia, observam bem o túmulo, veem o lugar, fixam na memória. Aquele sepulcro aberto do domingo de Páscoa é realmente de Jesus! Não é um engano! Em seguida, elas voltam para casa, preparando aromas e perfumes para poder ungir o corpo de Jesus depois do descanso do sábado.
Lucas 24,1-3: Os fatos encontrados: túmulo vazio, pedra removida
Seguindo de perto o Evangelho de Marcos, Lucas oferece informações detalhadas sobre a hora e o lugar. Estes detalhes sugerem que as mulheres são pessoas de confiança para testemunhar a ressurreição. Elas estão convencidas de que Jesus está morto, pois vão para o túmulo para ungi-lo. A sua fé na res¬surreição não foi fruto de fantasia, mas algo totalmente inesperado. Quando chegam ao sepulcro, veem que a pedra já tinha sido removida. Entrando dentro do sepulcro não encontram o corpo de Jesus. Estes são os fatos. Qual é o seu significado?
Lucas 24,4-8: O significado dos fatos: o anúncio da ressurreição
Dentro do sepulcro, elas encontram dois homens em vestes fulgurantes que lhes interpretam o significado destes fatos inexplicáveis: “Jesus está vivo. Ele ressuscitou!” Elas lembram as palavras do próprio Jesus e as palavras da Escritura. Daqui para a frente, a palavra de Jesus e a palavra da Escritura têm ambas o mesmo valor.
Lucas 24,9-12: Os apóstolos não acreditam no testemunho das mulheres
Lucas diz quem são as mulheres: Maria Madalena, Joana e Maria, a mãe de Tiago, bem como as outras que estão com elas. Voltando do sepulcro, elas anunciaram a Boa Nova aos Onze, mas estes não lhes dão crédito. Não foram capazes de crer no testemunho das mulheres. Dizem que é um “desvario”, invenção, fofoca. Naquele tempo, as mulheres não podiam ser testemunhas. Ao transmitir a elas a ordem de anunciar a Boa Nova da ressurreição, Jesus estará pedindo uma mudança total na cabeça das pessoas. Deviam dar crédito a quem, dentro da sociedade daquele tempo, não merecia crédito. Assim, começou a subversão do anúncio da ressurreição! Lucas termina dizendo que Pedro vai ao túmulo, encontra-o vazio e volta para casa. Mas não chega a crer. Fica apenas surpreso.
ALARGANDO
A experiência da ressurreição aconteceu, primeiro, nas mulheres (Mt 28,9-10; Mc 16,9; Lc 24,4-11.23; Jo 20,13-16); depois, nos homens. Ela é a confirmação de que, para Deus, uma vida vivida como Jesus é vida vitoriosa. Deus a ressuscita! Em torno desta Boa Nova surgiram as comunidades. Crer na ressurreição o que é? É voltar para Jerusalém, de noite, reunir a comunidade e partilhar as experiências, sem medo das autoridades dos judeus e dos romanos (Lc 24,33-35). É receber a força do Espírito, abrir as portas e anunciar a Boa Nova à multidão (At 2,4). É ter a coragem de dizer: “É preciso obedecer antes a Deus que aos homens” (At 5,29). É reconhecer o erro e voltar para a casa do pai: “Teu irmão estava morto e voltou a viver” (Lc 15,32). É sentir a mão de Jesus ressuscitado que, nas horas difíceis, nos diz: “Não tenha medo! Eu sou o Primeiro e o último. Sou o Vivente. Estive morto, mas eis que estou vivo para sempre. Tenho as chaves da morte e da morada dos mortos” (Ap 1,17s). É crer que Deus é capaz de tirar vida da própria morte (Hb 11,19). É crer que o mesmo poder usado por Deus para tirar Jesus da morte opera também em nós e nas nossas comunidades, através da fé (Ef 1,19-23).
Até hoje, a ressurreição acontece. Ela nos faz experimentar a presença libertadora de Jesus na comunidade, na vida de cada dia (Mt 18,20) e nos leva a cantar: “Quem nos separará, quem vai nos separar, do amor de Cristo, quem nos separará? Se ele é por nós, quem será contra nós?” Nada, ninguém, autoridade nenhuma é capaz de neutralizar o impulso criador da ressurreição de Jesus (Rm 8,38-39). A experiência da ressurreição ilumina a cruz e a transforma em sinal de vida (Lc 24,25-27). Abre os olhos para entender o significado da Sagrada Escritura (Lc 24,25-27.44-48) e ajuda a entender as palavras e gestos do próprio Jesus (Jo 2,21-22; 5,39; 14,26). Uma comunidade que quiser ser testemunho fiel da Boa Nova da Ressurreição deve ser sinal de vida, lutar pela vida contra as forças da morte. Sobretudo aqui na América Latina, onde a vida do povo corre perigo por causa do sistema de morte que nos foi imposto.
Carlos Mesters e Mercedes Lopes

ANO B – TRÍDUO PASCAL: VIGÍLIA DA RESSURREIÇÃO – 26.03.2016

A pedra rejeitada tornou-se princípio e fundamento da casa.

Como quando falece uma pessoa querida, reunimo-nos hoje em vigília, marcados pela dor da perda, recapitulando a história da salvação, regando as frágeis sementes de esperança que nos restam. Acompanham-nos muitas testemunhas que nos antecederam nessa travessia. Mas a vigília sempre nos possibilita também assumir a herança humana e espiritual de quem partiu, levantar o olhar, contemplar o horizonte e encontrar forças para continuar a caminhada. Aqui estamos, acariciando o pequeno fio de esperança: “Eu sei que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente...”
É uma ilusão inocente ou maldosa imaginar que nossa vida individual e social muda num golpe de mágica. A ação criadora de Deus é sempre lenta, e avança numa luta sem tréguas contra o vazio, o caos e o abismo. Como os hebreus fugindo do Egito, quem luta se vê frequentemente encurralado, com o mar intransponível à frente e as tropas ameaçadoras atrás. Nossa experiência ainda hoje é de que existem pessoas lutadoras e iniciativas promissoras, mas são frágeis e estão muito dispersas, como o povo de Israel no cativeiro da Babilônia. E sem falar nas perseguições e linchamentos judiciais e midiáticos, que querem abortar mesmo os mais frágeis projetos de mudança. Onde estão os sinais da páscoa?
O vazio da sepultura não é prova da ressurreição, mas convida a perceber que as marcas dos pregos e o corpo torturado não são a última palavra de Deus sobre a história. Na tumba vazia, anjos e mulheres estão anunciando que o caos do lixo pode dar lugar a uma criação harmoniosa, que o mar ameaçador pode ser atravessado a pé enxuto, que os grupos dispersos podem ser reunidos, que os crucificados caminham à nossa frente e vislumbram novidades em gestação. Precisamos abrir-nos às novas possibilidades escondidas no segredo do átomo, no íntimo das pessoas, nos caminhos da história...
Aquelas mulheres madrugadoras, as poucas conhecidas e as muitas anônimas, estão a nos dizer que, para entender o mistério da vida e da morte, precisamos retomar a Palavra de Jesus, do dinamismo da sua compaixão e doação. Como discípulos seus, não podemos insistir em buscar entre os mortos aquele que está vivo, em enclausurar no passado aquele que é presente e futuro. A admiração diante do túmulo vazio é apenas o começo, e não pode ser um convite a ‘voltar para casa’, ignorando solenemente nossa responsabilidade com a ‘casa comum’. É preciso morrer para o pecado e renascer para o cuidado!
Como cristãos, completamos em nossos corpos os sofrimentos de Jesus Cristo, ostentamos as marcas de quem vive a misericórdia e cuida da casa comum. A ressurreição se multiplica como semente no testemunho e nas iniciativas de discípulos e discípulas, comunidades e Igrejas, grupos e movimentos. Como na ressurreição de Jesus, os sinais pequenos e desprezíveis passam a ser reais e promissores. O batismo, recordado e celebrado comunitariamente na vigília pascal, expressa este dinamismo na vida de cada um de nós e da comunidade eclesial. Morreu o velho homem, nasceu uma nova criatura!
Já vivemos e sofremos o bastante para saber que esta passagem não é nem automática, nem evidente. Trata-se de um projeto de vida que, para ser realizado, exige disciplina e empenho sem tréguas. Porque a luta não é apenas contra inimigos externos, mas pede vigilância sobre nós mesmos e sobre a permanente tentação de sermos sempre os primeiros e os merecedores, deixando a ninguém o cuidado do que é de todos. Mas esta não é uma luta inglória, pois Jesus de Nazaré, nosso irmão maior, já venceu a batalha, removeu muitas pedras, derramou sobre nós seu Espírito e nos fez capazes de compaixão.
Os primeiros cristãos resgataram uma imagem preciosa para falar da ressurreição de Jesus: Ele é como uma pedra que os construtores jogaram no lixo e que Deus transformou em pedra de ângulo, pedra que sustenta todo o teto em forma de abóbada. Por isso, a páscoa pede que abramos os olhos e as portas às pessoas e grupos sociais descartados como desnecessários ou eliminados como incômodos. Se não os tivermos no coração das nossas preocupações, celebrações e projetos eclesiais, nossa fé poderá ser como casa construída sobre a areia, e nossa utopia pode se deteriorar em simples ideologia.
Senhoras da madrugada, mulheres-coragem: humildemente pedimos vossa ajuda para caminhar na noite que nos envolve, para ver com nossos próprios olhos que o mestre de vocês e nosso nos precede na periferia e no deserto. Segurem nossas mãos cansadas e acompanhem nossos passos inseguros. Emprestem-nos um pouco do perfume que vocês souberam conservar, a fim de não chegarmos de mãos vazias ao encontro com Aquele que vive para sempre. E então anunciaremos de mil modos que a carne amada e amante de Jesus vivifica todos os sonhos e esperanças que habitam nossa humanidade. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Gênesis 1,1-2,2 * Salmo 103 * Êxodo 14,15-15,1 * Romanos 6,3-11 * Evangelho de Lucas 24,1-12)

terça-feira, 22 de março de 2016

Prisão e condenação de Jesus

Prisão de Jesus (Lc 22,39-53)

Enquanto estava em Jerusalém, Jesus passava o dia ensinando no templo e pernoitava no monte chamado das Oliveiras (Lc 21,37). Depois de celebrar a ceia com os doze, nosso texto começa dizendo que, como de costume, foi para o monte das Oliveiras (Lc 22,39). Só que agora, Judas Iscariotes conhecia o lugar onde Jesus passava a noite com seu grupo. E Jesus sabia que Judas deixara se subornar pelos sumos sacerdotes e que estava fazendo o jogo deles para o entregar.
Nesta, que é a sua noite derradeira, ele está diante de duas opções, uma vez que está iminente a possibilidade de ser capturado pela cúpula do templo, sumos sacerdotes e anciãos, amparada pelos comandantes da guarda do templo (Lc 22,52). João lembra que também um batalhão romano reforçava o aparato repressivo (Jo 18,3). Jesus ainda tinha tempo de desistir do projeto do Pai e tentar salvar a sua própria pele. E esta foi sua última tentação: Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice (Lc 22,42a). No entanto, ele decidiu ser fiel até o fim: contudo, não seja feita a minha vontade, mas a tua (Lc 22,42b), mesmo que essa opção lhe custasse a vida.
Na primeira parte da narrativa (Lc 22,39-46), encontramos Jesus resistindo contra sua última tentação. E resistiu sozinho, pois nem recebeu o apoio de seus discípulos, que dormiram em vez de orar com ele, apesar de sua insistência (Lc 22,40.46). E era preciso muita força para vencer a tentação de não ser fiel à missão para a qual o Espírito do Senhor o havia ungido (Cf. Lc 4,18-19). Então, solitário e com profunda angústia humana, Jesus busca na comunhão com o Pai, na oração, as forças para perseverar até o fim e, apesar de uma situação tão extrema, revelar em suas atitudes o agir do próprio Pai (Lc 22,41.44.45).
Na segunda parte (Lc 22,47-53), uma vez vencida a tentação de desistir, temos o relato da covarde prisão de Jesus pelas autoridades do templo à noite, para que o povo nada percebesse (Lc 22,2; 20,19). Judas, com a saudação usual entre amigos, traiu seu mestre com um beijo, identificando quem deveria ser preso. Os discípulos reagem com violência. Jesus, no entanto, recusa a violência e, para além disso, ainda cura o ferimento na orelha do servo do sumo sacerdote (Lc 22,50-51).
Assim, Jesus mesmo dá o exemplo de amor aos inimigos, de fazer o bem aos que vos odeiam, de falar bem dos que falam mal de vós e de orar por aqueles que vos caluniam (Lc 6,27-28). Jesus também desmascara a covardia das autoridades. Se ele fazia o confronto abertamente no templo, anunciando a verdade do Evangelho, anciãos, a elite econômica, e sumos sacerdotes, a elite religiosa, entretanto, fugiam das verdades do Reino para prendê-lo com espadas e paus às escondidas como se fosse um bandido (Lc 22,52-53). Naquele tempo e ainda hoje, esse é o comportamento hipócrita de quem está no poder, fazendo tudo para garantir seus privilégios, sejam religiosos, políticos ou econômicos. Eles acusam de hereges, terroristas, desordeiros e vagabundos a quem luta por justiça e vida digna para todas as pessoas.
Para perseverar na fidelidade a Jesus e a seu projeto, além da força da comunidade que celebra a partilha ao redor da mesa, é fundamental uma vivência pessoal de oração, de íntima comunhão com o Espírito de Deus, a fim de não cairmos na mesma tentação de Pedro: ‘Mulher, eu nem o conheço!’ ‘Não, homem, eu não!’ ‘Homem, não sei de que estás falando!’ (Lc 22,57-60). E quando cedemos diante das tentações, importa ter a mesma atitude de Pedro, isto é, reconhecer a queda e mudar de vida (Lc 22,61-62).
Ildo Bohn Gass

ANO C – TRÍDUO PASCAL: PAIXÃO E MORTE DE JESUS – 25.03.2016

Com Cristo e em Cristo, a morte é semente e dom de amor.

O comércio não sabe o que fazer com esta sexta-feira, e um clima estranho envolve pessoas e cidades. Até as mais indiferentes intuem que algo inexplicável aconteceu e acontece nesse dia. Uma multidão se reúne nos templos: gente experimentada na dor, gente que percebe que neste dia se revela o que há de mais profundo no ser humano e que há de mais belo no coração de Deus. O mistério da iniquidade humana atinge sua força e sua expressão mais terrível. A humanização de Deus atinge seu ponto mais luminoso. A entrega do ser humano a Deus se expressa em seu grau máximo. A fidelidade de Deus à sua aliança com a humanidade concretiza uma misericórdia que passa de geração em geração.
Como todos os escravos e servos, Jesus não tem aparência nem beleza que possa atrair os olhares. Ele é como uma raiz em terra seca, como uma pessoa frente à qual escondemos o rosto. “Não parecia gente, tinha perdido a aparência humana”, diz o profeta. Mas sua vida é semente, tem futuro! O Servo fiel não perde sua vida, pois a dá livremente e, por isso, prolonga sua existência. Ele carrega nas costas a exclusão e o desprezo de muitos, e, por isso, a luz brilha em seu rosto e em todo seu corpo de servo. Ele confia seu destino nas mãos daquele que é tem segredo da vida, e assim vive naqueles são misericordiosos.
Conhecemos muito bem as tramas e traições que levaram à prisão e condenação de Jesus. São opções e atitudes que revelam o mistério da iniquidade e sua força nas pessoas e nas estruturas sociais. É um mal nada abstrato, bem concreto, que se expressa nos costumes, nas leis, nos medos, em todas as formas de ambição. Um mal que assume feições de cinismo, como quando as autoridades religiosas, tendo decidido matar Jesus, não entram no palácio do governador para não se tornarem impuras...  É este inexplicável mistério da iniquidade que faz com que seja noite às três horas da tarde...
Jesus não parece disposto a se defender. Ele tem consciência de que nasceu e veio ao mundo para dar testemunho da verdade, para tornar palpável e digna de crédito a fiel compaixão de Deus pelas pessoas negadas em sua dignidade. Pilatos manda torturá-lo e, depois, o apresenta ao povo: “Eis o homem!” Fixemos o olhar neste personagem que realiza em grau pleno a vocação de todo ser humano. Nele descobrimos que a pessoa humana atinge sua plenitude quando não recua no propósito de dar a vida e de servir, quando não abre mão da solidariedade com as pessoas negadas em sua dignidade.
O ser humano maduro e liberto não é o ‘amigo de César’, a pessoa age sem autonomia, nem a autoridade religiosa, que ordena por medo, mas Aquele que transcende os interesses individuais e se põe a serviço de Deus e do seu projeto. Por isso, do alto da cruz, Jesus diz que, no seu corpo feito dom, a criação chega ao seu ápice: “Tudo está consumado.” Nele Deus chega ao máximo de si mesmo e se supera no esvaziamento. Nele o ser humano vence todos os limites e se faz dom e semente fecunda nas mãos de Deus. Nada há de mais amável e desejável que isso! Bendito seja Deus!
“O que é que vocês estão procurando?”, pergunta Jesus aos primeiros discípulos (Jo 1,38). E hoje, nesta sexta-feira da paixão, o que buscamos nós? Aqui só é licito buscar forças para caminhar na fé e perseverar no seguimento de Jesus, o rosto da misericórdia de Deus. Do alto da cruz ele se dirige a Maria e lhe confia João: “Mulher, eis aí teu filho!” E, dirigindo-se ao discípulo, diz: “Eis aí tua mãe!” Assim, aos pés da cruz,  nasce uma nova família, não mais restrita aos laços de sangue ou de interesses mesquinhos, mas cuidadora da vida e compassiva com todos os humanos seres que querem viver e promover a vida.
É por isso que nesta santa sexta-feira nossa oração se abre em uma universalidade que não deveria estar ausente de nenhuma celebração cristã: rezamos pela Igreja, pelo papa e todos os ministros, mas também pela união das diferentes Igrejas cristãs, pelos judeus e pelos não-cristãos, pelos que não acreditam em nada, pelas autoridades e pela humanidade sofredora. Diante do crucificado, filho da humanidade e filho de Deus, aprendemos que os muros e fronteiras religiosas, políticas, econômicas e culturais não fazem o menor sentido e virarão ruínas. Pertencemos à humanidade, temos uma casa e um destino comum.
Diante de ti, Jesus de Nazaré, Irmão da humanidade sofredora, prostramo-nos agradecidos e comprometidos. Nossas chagas e culpas pesam sobre teus ombros, mas o dom do teu amor sem fronteiras nos regenera. Tua mãe e teu amigo nos acolhem numa comunidade-semente de um mundo novo, e a água que brota do teu lado aberto nos livra de todos os medos. Beijamos enternecidos tuas chagas, pedindo que teu Espírito impeça que este beijo seja de traição. E assim seremos capazes de beijar, abraçar e acompanhar a imensa caravana dos sofredores que só podem esperar em ti. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaías 52,13-53,12 * Salmo 30 (31) * Carta aos Hebreus 4,14-15; 5,7-9 * Ev. de João 18,1-19,42)

segunda-feira, 21 de março de 2016

A ceia de Jesus

Desejei muito comer esta Páscoa com vocês! (Lc 22,14–23)

O ambiente estava tenso. Era a última ceia de Jesus com seus discípulos. Judas já tinha decidido trair Jesus. Os outros estavam com medo, sem entender os acontecimentos. Mas estas contradições tão dolorosas não impediram a Jesus de renovar a Aliança. O seu amor era maior que as falhas e as fraquezas dos amigos.
SITUANDO
Lucas descreve a paixão, morte e ressurreição de Jesus. Inicia-se a etapa final do "êxodo" de Jesus, anunciado por Moisés e Elias no Monte da Transfiguração. A maneira de Lucas descrever os acontecimentos é semelhante àqueles filmes que, primeiro, mostram a cena de longe. Em seguida, pouco a pouco, eles ajustam a câmera e a cena vai chegando mais perto, até que se possam ver todos os detalhes.
Assim faz Lucas. Desde o capítulo 9, ele vem dizendo que Jesus está indo para Jerusalém. E agora, uma vez em Jerusalém, ele vai ajustando a câmera no ponto em que os leitores e as leitoras devem prestar mais atenção: Primeiro, ele diz: "Aproxima-se a festa dos ázimos, chamada Páscoa" (Lc 22,1). Em seguida, informa: "Chegou o dia dos ázimos" (Lc 22,7). E finalmente, constata: "Quando chegou a hora, ele sentou à mesa" (Lc 22,14). Este é o ponto onde Lucas quer que a gente preste toda a atenção, pois é o momento em que começa a Páscoa, o êxodo de todos.
COMENTANDO
Lucas 22,14-18: Início da Ceia Pascal
"Desejei ardentemente comer esta Páscoa com vocês!" É como se dissesse: "Até que enfim! Chegou o momento que tanto desejei!" Jesus tem o desejo ardente de levar a bom termo o projeto do Pai. É a última vez que ele está reunido com seus amigos. É a Páscoa definitiva, em que ele celebra a Nova Aliança e realiza a passagem da opressão da antiga lei para a revelação da lei do amor. Jesus enche um cálice de vinho e o distribui aos amigos. Beber o cálice significa cumprir a missão recebida do Pai (Mc 10,38-39; Jo 18,11). Jesus bebe o cálice que o Pai lhe deu e pede que seus amigos participem.
Lucas 22,19-20: A instituição da eucaristia
O último encontro de Jesus com os discípulos realiza-se no ambiente solene da celebração tradicional da Páscoa. Eles estão reunidos para comer o cordeiro pascal e, assim, lembrar a libertação da opressão do Egito. O contraste é muito grande. De um lado, os discípulos: eles estão inseguros, sem entenderem o alcance dos acontecimentos. De outro lado, Jesus que faz um gesto de partilha, convidando seus amigos a tomar o seu corpo e o seu sangue. Ele distribui o pão e o vinho como expressão do que ele mesmo está vivendo naquele momento: doar sua vida, distribuir-se aos outros para que eles possam viver, revelar o amor do Pai. Este é o sentido da eucaristia: aprender de Jesus a distribuir-se, doar-se, entregar-se, servir, sem medo dos poderes que ameaçam a vida. E Jesus acrescenta uma frase que só Lucas conservou: "Fazei isto em memória de mim" (Lc 19,22; cf. 1Cor 11,24.26).
Lucas 22,21-23: Anúncio da traição de Judas
Estando reunido com os discípulos pela última vez, Jesus anunciou: "A mão daquele que me trai está comigo sobre a mesa". Este jeito de falar acentua o contraste. Para os judeus a comunhão de mesa era a expressão máxima da amizade, da intimidade e da confiança. Em outras palavras, Jesus vai ser traído por alguém muito amigo! E ele acrescenta: "Sim, o Filho do Homem vai morrer, segundo o que foi determinado!" Aqui não se trata de predestinação nem de fatalismo. Trata-se da certeza que a experiência humana de séculos nos comunica: num mundo organizado a partir do egoísmo, quem decide viver o amor vai morrer crucificado. E Jesus termina: "Ai daquele homem por quem o Filho do Homem foi entregue!" Será para sempre conhecido e lembrado como o traidor de Jesus!
ALARGANDO
A grande luta. De um lado, Jesus. Animado pelo Espírito de Deus, ele procura realizar o projeto do Pai. Do outro lado, os inimigos de Jesus. Animados pelo espírito oposto, procuram realizar o projeto de satanás. "Satanás entrou em Judas" e o levou a conferenciar com os sacerdotes, que estavam procurando um meio para eliminar Jesus, mas temiam o povo. Combinaram o preço e Judas começou a procurar um jeito de entregá-lo. É na última ceia que as duas forças se encontram e se enfrentam! Jesus diz: "A mão que me trai está comigo sobre a mesa". Por de trás da luta entre os homens está a luta entre os poderes. O vencedor será Jesus.
Lucas acentua a semelhança entre o êxodo e a paixão, morte e ressurreição de Jesus. No êxodo antigo, conduzido por Moisés, Deus libertou o povo da lei do faraó que oprimia e escravizava o povo. No novo êxodo, conduzido por Jesus, Deus liberta o povo da escravidão da lei, que o impedia de perceber e de experimentar o amor acolhedor de Deus como Pai. No antigo êxodo, nasceu o povo, feito de muitas raças e tribos diferentes. O que os unia e fazia deles um só povo era a fé comum em Javé, o Deus libertador. No novo êxodo, nasce um novo povo, feito de muitas raças, culturas e etnias. O que nos une não é o sangue nem a raça, mas sim a fé comum em Jesus. Ele nos revelou a misericórdia e a ternura do Deus libertador que não exclui a ninguém. 
Carlos Mesters e Mercedes Lopes

ANO C – TRÍDUO PASCAL: CEIA DE JESUS – 24.03.2016

Um pão partilhado, um corpo unido, e a casa bem cuidada!

Hoje nos reunimos para celebrar a Aliança nova, terna e eterna de Deus conosco, filhas e filhos queridos, família na qual o Filho de Deus se faz irmão. A mesa está pronta, e há lugar para todos, inclusive para pecadores como nós, porque sua misericórdia é eterna e incondicional. O próprio Jesus de Nazaré nos diz que preparou e desejou ardentemente celebrar este momento conosco (cf. Lc 22,15). E não recusamos o convite porque intuímos que não temos outra honra senão esta de trazer em nossos sonhos, projetos, ações e relacionamentos as marcas da cruz de Cristo, do seu amor compassivo e sem fronteiras.
Na mesa que reúne pessoas que desejam ardentemente viver uma fraternidade sem fronteiras, fazemos memória, recordamos coisas maravilhosas e animadoras. Esta celebração é um memorial dos inúmeros êxodos e travessias que somos convidados a empreender: travessias de um eu fechado em si mesmo para uma comunidade aberta e solidária; de uma mesa grande e vazia para uma mesa farta e partilhada; de projetos estreitos e ancorados no sucesso pessoal para utopias coletivas; de lutas empreendidas contando apenas conosco mesmos para alianças muito mais que estratégicas...
A ceia eucarística é a memória de Jesus e dos discípulos que, tendo atrás as memoráveis experiências das refeições partilhadas com toda sorte de pecadores e à frente a ameaça dos poderes que não toleram mudanças, compartilham suor e sangue, vinho e pão. A eucaristia é o alimento de quem está na estrada, e não privilegio dos que se pretendem perfeitos. Celebramos esta ceia e aceitamos a aliança que Deus nos oferece ainda “na terra do Egito”. Sentamos à mesa e celebramos esta refeição prontos a empreender travessias mais que urgentes e necessárias: com cintos que diminuem os embaraços; com sandálias que agilizam os passos; com cajados com os quais nos defendemos e que nos sustentam nos vales escuros.
No centro desta magnífica refeição não está um cordeiro, mas um corpo feito inteiramente dom. Jesus Cristo oferece a totalidade concreta da sua vida como dom, partilha e aliança. É sua vida, o que ele mesmo é, que ele nos dá sem reservas e sem impor condições. E o faz numa ceia ordinária, numa refeição marcada pelo afeto fraterno, num contexto de ameaça de morte, pedindo insistentemente que façamos o mesmo para manter viva sua memória. “Amai-vos uns aos outros como eu vos tenho amado...” A eucaristia faz da Igreja uma comunidade aberta, em saída, dom àqueles que estão fora ou estão “longe”.
Jesus ilustra o sentido da sua vida feita aliança no gesto de lavar os pés. Ele havia dito e repetido que viera para servir e não para ser servido, como Servo e não como Senhor. Demonstrara isso numa dedicação sem cansaço aos últimos da sociedade. Pois agora, depois de repartir pão e vinho, deixa a mesa e assume o serviço próprio de mulheres e crianças, lavando os pés daqueles que estavam à mesa. Nele, é o próprio Deus que se inclina diante da humanidade e, de joelhos, lava nossos pés. E não o faz para demonstrar humildade, mas para desfazer as hierarquias e afirmar a absoluta igualdade de todos.
Pedro – e, com ele, outros, história afora! – reage diante da lição de Jesus. Não lhe parece bem mudar as coisas assim tão radicalmente: para ele, senhores e superiores devem ser honrados; servos e inferiores devem ser desfrutados; esta é a ordem e nada deve ser mudado. Parece-lhe difícil aceitar que esta não seja a ordem querida por Deus, que participar da eucaristia implica em fazer-se memória viva da vida de Jesus Servo... Como custa à Igreja e a cada um de nós assimilar esta lição: Deus não se identifica com o soberano, mas com o servo; somente quem hipoteca sua vida pelos outros a ganha verdadeiramente.
A lição é difícil e nada óbvia. É por isso que, depois de comer e de lavar os pés dos discípulos, Jesus nos interroga: “Vocês compreenderam o que eu acabei de fazer?” E, para não deixar dúvidas, explica: “Eu lhes dei um exemplo... E vocês serão felizes se o puserem em prática...” Precisamos passar da memória e do gesto teatral à vida. É preciso dar conteúdo e concretude à eucaristia no dom cotidiano aos outros, no serviço despojado a todos, aos migrantes de todas as procedências, mesmo àqueles que aparentemente não o merecem, à casa comum... “Amai-vos uns aos outros como eu vos tenho amado...”
Jesus, Filho de Deus e da Humanidade, peregrino nas estradas de um mundo desigual, arauto de um tempo novo e promissor. Ajuda-nos a não deixarmos no interior do templo a toalha que nos dás como hábito e identidade. Abre nossa mente e nossas mãos para que o serviço aos irmãos e irmãs não se limite à intenção, mas se realize nas estradas e esquinas do mundo. Faz que superemos os ritos e transformemos teu gesto em prática cotidiana. Guia e sustenta a Igreja no caminho do esvaziamento que a faz livre e capaz de cuidar da casa comum e de servir, sem outra parcialidade senão a preferência pelos últimos. Amém! Assim seja!

Itacir Brassiani msf
(Livro do Êxodo 12,1-14 * Salmo 115 (116) * 1ª Carta aos Críntios 11,23-26 * Evangelho de João 13,1-15)