quarta-feira, 30 de março de 2016

ANO C – SEGUNDO DOMINGO DA PÁSCOA – 03.04.2016

Do encontro com Jesus ressuscitado, brota nossa missão.

A provocadora luz da ressurreição de Jesus normalmente não brilha de forma repentina e poderosa na vida dos cristãos. Ela vai se acendendo aos poucos... Naquela noite do primeiro dia da semana, as portas da sala, onde se encontravam os discípulos desiludidos e assustados, estavam firmemente trancadas. O ambiente externo era hostil e aquele punhado de sonhadores cheios de ambiguidades sentia-se desamparado. A lembrança da traição de Jesus por um deles, da negação pública de um dos principais e da deserção de quase todos doía e envergonhava. Era noite por fora e por dentro, e nem mesmo a Boa Notícia anunciada por Maria Madalena conseguira arrancá-los daquela prostração.
Este ambiente noturno e fechado contrasta com a manhã luminosa e aberta na qual Maria Madalena se encontrara com Jesus ressuscitado (cf. Jo 20,1-18). Os discípulos vivem a mesma sensação de escuridão e ameaça que haviam experimentado ao atravessar o lago, depois da tentativa frustrada de transformar Jesus em rei (cf. Jo 6,16-21). Mas as trevas da noite costumam ser proporcionais à luz da aurora que se esconde no seu ventre, como aquela noite na qual Deus fez vigília e iniciou a libertação do povo do Egito (cf. Ex 12,42; Dt 16,1), e como em tantas outras noites da história da humanidade.
Superando todos os obstáculos, Jesus irrompe no meio dos discípulos, e não o faz para advertir e acusar. Os discípulos se alegram quando Jesus, mostrando-lhes as mãos e o lado, se apresenta como Cordeiro com o qual se inicia a festa do êxodo libertador. Ele faz questão de mostrar as mãos nas quais o Pai tinha posto tudo (cf. Jo 13,3); as mãos que realizaram as ações libertadoras de Deus (cf. Jo 3,36); as mãos firmes das quais nenhuma ovelha pode ser arrancada (cf. Jo 10,28). Estas mãos perfuradas simbolizam a historicidade e a concretude humana da sua presença na comunidade de fé.
Mas Jesus quer, porém, evitar a tentação de uma paz que consola e acomoda. Como Deus havia feito no início da criação, Jesus transmite seu Sopro aos discípulos e os constitui agentes vivificadores, sinais e instrumentos de uma nova criação. “Então soprou sobre eles e falou: ‘Recebei o Espírito Santo’.” Assim, a experiência pascal é êxodo corajoso e libertador de todos os fechamentos e redis para prosseguir o caminho trilhado por Jesus. Não encontraremos nem conheceremos verdadeiramente Jesus Cristo ressuscitado enquanto não estivermos situados num horizonte de esperança e de ação missionaria.
Somos enviados como ele foi enviado pelo Pai, como Cordeiros que carregam o pecado do mundo, pois perdoar é libertar uma pessoa de um peso que prende e impede de viver plenamente, como Jesus fizera com a mulher samaritana (cf. Jo 4,1-42), com o homem que sofria há 38 anos (cf. Jo 5,1-18), com a mulher acusada de adultério (cf. Jo 8,1-11), com o cego de nascença (cf. Jo 9,1-41). Conduzidos e fortalecidos pelo Espírito de Jesus, somos enviados para construir uma comunidade de homens e mulheres que procuram romper com o espírito do mundo e tomar distância das estruturas de pecado.
A primeira expressão da missão que brota da experiência pascal é o testemunho de vida fraterna e solidária, diante do qual a sociedade é obrigada a tomar posição. E a segunda é, como nos mostra João evangelista, o anúncio de que isso é feito em nome de Jesus, “o primeiro e o último, Aquele que vive”, a pedra rejeitada pelos construtores e escolhida por Deus como pedra principal. É em Jesus que se fundamenta nosso novo viver e nossa irrenunciável missão. Mas desde sempre, como nos mostra Pedro, a missão dos cristãos é também ação transformadora: todos os que se aproximavam dele eram curados.
Hoje a missão continua, e vai sendo tecida pelos fios do testemunho, do diálogo, do anúncio e o serviço que defende e promove a vida. Partindo do encontro com o Ressuscitado, o anúncio e o testemunho são vividos não apenas no cuidado dos doentes, mas também nas diversas iniciativas e cuidados pastorais em favor das crianças, dos encarcerados, dos migrantes, dos operários, da mulher marginalizada, da juventude, da terra, da família, do ambiente, nossa casa comum. As pessoas têm o direito de sentir em nós a mão do próprio Jesus Cristo tocando seus ombros cansados e espantando o medo!
Jesus de Nazaré, Cordeiro de Deus, o último num mundo obcecado pelo poder e o primeiro no Reino de Deus... Na mesa da tua Palavra e do teu Corpo somos nutridos e encorajados a partir em missão e tirar o pecado do mundo, amar e servir incondicionalmente. E o faremos tornando-nos uma bênção que de mil formas toca, desperta, cura, liberta. Não permitas que, como ocorreu com Tomé, nos separemos do corpo eclesial e, assim, sejamos incapazes de te reconhecer vivo entre nós. E dá-nos a graça de crer em ti apoiando-nos no testemunho daqueles que provaram teu amor e tocaram tuas chagas. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 5,12-16 * Salmo 117 (118) * Apocalipse 1,9-13.17-19 3,1-4 * Evangelho de João 20,19-31)

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