quinta-feira, 17 de março de 2016

ANO C – DOMINGO DE RAMOS – 20.03.2016

Jesus nos dá vida, seu estilo de vida, sua própria vida!
Depois de 40 dias de preparação, eis que se abrem as portas de uma semana que vale uma vida. Com ramos e flores, faixas e bandeiras e cânticos reunimo-nos nas ruas e templos para aclamar nosso líder manso e humilde. “Bendito aquele que vem em nome do Senhor!” Só alguém infinitamente grande é capaz de fazer-se tão pequeno e próximo. Na celebração que abre a Semana Santa somos convidados acompanhar Jesus no seu caminho de fidelidade, de oferta generosa da sua vida e realização plena da vontade do Pai. Deus se recusa a dar uma esmola à humanidade: ele se dá a si mesmo em Jesus de Nazaré e, no seu corpo e sangue, assina uma parceria com prazo indeterminado.
Para entender o relato da entrada de Jesus em Jerusalém temos que abandonar todas as fantasias de poder e de sucesso. Ela não tem nada de triunfal. Jesus vem da Galiléia e entra na capital do seu país, economicamente e politicamente dominado por Roma, montado num jumento. Nada de cortejos de honra, nem de generais e cavalos vistosos ou de gestos de cortesia a grandes senhores. Como diz o hino de Paulo, Jesus chega a Jerusalém como sempre foi: um servidor, um simples homem, esvaziado de interesses egoístas e radicalmente obediente às necessidades dos outros.
Depois de uma longa caminhada, o profeta galileu chega à capital do país caminhando à frente de um numeroso, entusiasmado e, às vezes, desconcertado grupo de discípulos e discípulas. O povo do campo o aclama como filho e herdeiro de Davi. “Bendito o Rei que vem em nome do Senhor!” Era um coro de pessoas que, como o velho Simeão, sabiam reconhecer num indignado e revolucionário Aquele que vem em nome de Deus e atualiza sua ação libertadora. Mas isso contrasta com a fria acolhida por parte do povo de Jerusalém e com o medo indisfarçável dos próprios discípulos.
O grupo que acolhe e acompanha Jesus na entrada nada triunfal em Jerusalém saúda o despontar do reino messiânico inspirado em Davi e a chegada do líder enviado por Deus. Ele, porém, não realiza as ações impressionantes que muitos esperavam. Chegando perto da capital amada e cantada em prosa e verso, Jesus a contempla de longe e chora, lamentando o fechamento à profecia e o apego às leis e demais instituições. Ele é o servo paciente e o ouvinte atento da Palavra do qual fala Isaías. E é dessa escuta que brota uma palavra que desperta os adormecidos e encoraja os acorrentados pelo medo.
A entrada de Jesus montado num jumento é uma poderosa sátira aos libertadores militares, conhecidos no passado, temidos no presente ou esperados para o futuro. Mas o entusiasmo suscitado naquele pequeno grupo de gente interiorana não durará muito tempo. Os gritos de ‘hosana’ logo serão substituídos pelo insolente ‘crucifica-o’, fruto da frustração do povo e da manipulação das autoridades. O grupo mais exaltado dos discípulos solta a voz e o proclama o Messias esperado, mas Jesus faz questão de demonstrar seu messianismo pobre e manso e entra montado muito a gosto num jumento.
A divisão entre os discípulos e a possibilidade de traição não fazem Jesus mudar seu plano. É verdade que ele se sente abatido e chega a se perguntar sobre o rumo a seguir. No momento crucial, depois da festa de acolhida e da ceia de despedida, enfrenta um discernimento difícil e pede aos discípulos que fiquem com ele e vigiem.  É um exercício de confronto profundo com a vontade do Pai, com a missão escrita em caracteres confusos e exigentes. Para os discípulos de todos os tempos, a oração continua sendo um espaço para discernir com retidão e coerência os caminhos que levam à vida em abundância.
Aclamemos com jovial alegria e convincente esperança o mestre e profeta Jesus de Nazaré. Acompanhemos de perto seus passos, acolhamos seus gestos, escutemos suas palavras. Superemos a tentação de segui-lo de longe e de evitar maiores riscos, como fizeram Pedro e os outros. Não esqueçamos que tantos discípulos e discípulas pelos séculos a fora permaneceram com ele, comungaram seu destino e se tornaram semente. Entre estes está o nosso querido e incompreendido Dom Oscar Romero, cujo martírio recordaremos no próximo dia 24 e cuja santidade o povo já reconheceu.
Jesus de Nazaré, filho e herdeiro de Davi, messias servidor e humilde: diante de ti dobramos os joelhos e estendemos nossas vestes e ramos. Te oferecemos nosso corpo para que entres hoje em nossas praças e cidades, para anunciar com timbre de sino a dignidade daqueles que não a têm reconhecida e assegurada. Não deixes que a aclamação que fazemos na liturgia seja negada pelas nossas atitudes. Ensina-nos de novo a sagrada lição da Ceia e da Paixão: que não existe maior prova de amor que cuidar da casa comum e doar a vida por quem amamos. E dai-nos a graça da vigilância e da perseverança. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
(Profecia de Isaías 50,4-7 * Salmo 21 (22) * Carta aos Filipenses 2,6-11 * Lucas  19,28-40 e 22,14-23,56)

Nenhum comentário: