quinta-feira, 21 de julho de 2016

ANO C – DÉCIMO-SÉTIMO DOMINGO DO TEMPO COMUM –24.07.2016

Rezar bem, para alargar a visão e perseverar na caminhada.

A catequese de Jesus sobre a oração proposta pela liturgia de hoje está inserida no contexto da caminhada de Jesus para Jerusalém, onde se daria o confronto decisivo entre seu projeto de vida e os poderes oficiais do judaísmo e do império romano. Depois de relatar o ensino de Jesus sobre a necessidade de fazer-se próximo de quem está em situação de vulnerabilidade e nos apresentar sua lição na casa de Marta e de Maria, Lucas começa dizendo muito genericamente que “um dia, Jesus estava orando num certo lugar”. Mas não dá maiores detalhes sobre o conteúdo e a forma dessa oração.
Pelo contexto, podemos perceber que a oração de Jesus está claramente a serviço da fidelidade à decisão de construir o Reino de Deus mediante o serviço profético em favor dos últimos e do enfrentamento das forças que se lhe opõem. Pelo que deixam entender os evangelhos, nos momentos de oração Jesus vislumbra e recoloca diante de si o horizonte maior do Reino de Deus, e, assim, confirma seus passos nesta direção. Mas Jesus não parece preocupado em pedir que os discípulos rezem: ele simplesmente se retira em oração para confirmar sua identidade e renovar sua responsabilidade.
Observando que Jesus reza, os discípulos pedem que ele lhes ensine a rezar. Eles conheciam os ritos e fórmulas de oração ensinados por João Batista e por outros líderes religiosos, e parece que desejam que Jesus lhes ensine ritos e práticas definidas e rígidas de oração. Estariam eles ansiando por práticas espirituais que os dispensem das exigências da conversão ao Reino, do despojamento e do dom de si mesmos? Mas, longe de induzir à passividade e a uma visão mágica da vida, a oração cristã ajuda a potencializar os recursos de que dispomos para construir a vida e transformar a história.
A oração, especialmente a súplica, supõe, expressa e cultiva a consciência de que nos falta algo importante. Quem dispõe de todos os poderes não precisa pedir nada nem agradecer a ninguém. E quem está absolutamente satisfeito com o presente não espera nada para a futuro, a não ser um prolongamento repetitivo do presente.  No pedido está embutido também o senso de urgência e de responsabilidade pessoal e comunitária diante dos dramas e necessidades do mundo. A oração que Jesus Cristo ensina supõe esta consciência diante da grandeza e da urgência da missão.
Para Jesus, Deus é Alguém bom, presente e próximo como um pai, e a oração se sustenta numa relação de absoluta confiança, amizade e intimidade com Ele. Esta confiança permite até a insistência em favor dos amigos, como demonstram o pedido de Abraão em favor do povo de Sodoma e a parábola do vizinho que bate à porta do amigo para pedir-lhe ajuda. Santificar o nome o nome de Deus, que é primeiro desejo expresso na oração ensinada por Jesus, significa esperar, reconhecer e promover ação libertadora de Deus na história. Na tradição bíblica, Deus é santificado quando liberta os oprimidos, perdoa os pecadores, sacia os famintos, repatria os exilados, garante um abrigo aos deserdados.
Mas o rio da santidade de Deus, que fertiliza a terra e possibilita uma vida abundante aos seus filhos e filhas, tem um leito ainda muito estreito que precisa ser alargado. E aqui a oração funciona como uma espécie de pedagogia que suscita e ressuscita em nós o ardente anseio do Reino de Deus. “Venha o teu Reino!” Esta súplica profunda e envolvente ajuda a evitar duas atitudes pouco cristãs: a conformidade resignada com o mundo do jeito que está; a preocupação escapista com uma indefinida vida depois da morte. E estimula o ardente desejo do pão farto e gostoso em todas as mesas, todos os dias.
A oração cristã é uma ação essencialmente comunitária, e está voltada ao presente histórico. E isso está patente na segunda parte da oração que Jesus nos ensinou: os pedidos estão na segunda pessoa do plural e são expressão da voz de uma comunidade. Mesmo quando oração é feita individualmente, sempre supõe uma comunhão real, profunda e visceral não apenas com os cristãos da comunidade ou mesmo da Igreja, mas com a humanidade e a criação inteira. É disso que fala o pedido do ‘pão nosso de cada dia’ e do perdão das nossas ofensas na medida do perdão que concedemos a quem nos ofendeu.
Jesus de Nazaré, filho amado do Pai, irmão e amigo da humanidade e mestre na arte de rezar: ajuda-nos a pedir o que realmente necessitamos para continuar no teu caminho. Tanto nosso pai Abraão como tu mesmo sublinhas a importância de pedir com confiança, e até insistir nos pedidos. Mas qual é o pedido que o teu e nosso Pai não deixa sem resposta? Certamente não é o alimento, nem simplesmente a saúde, o sucesso ou uma boa morte. O que necessitamos realmente é do teu Espírito, sem o qual não há discipulado, profecia, liberdade e vida verdadeiras. Envia-nos teu Espírito, Senhor, e isso nos basta! Amém! Assim seja!

Itacir Brassiani msf
(Livro do Genesis 18,20-32 * Salmo 137 (138) * Carta aos Colossenses 2,12-14 * Evangelho de S. Lucas 11,1-13)

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