quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Curso de missiologia (Passo Fundo - 10)

A indispensável conversão missionária da paróquia e da comunidade
Para a Conferência de Aparecida, por mais indispensável que pareça ser, a paróquia não é a base da Igreja, mas uma célula viva, um elemento básico. O que é intrínseco à Igreja é a comunhão, e não a paróquia. Esta é um dos lugares eclesiais de comunhão (ao lado das dioceses, das comunidades de base e das conferências episcopais), embora continue sendo célula viva da Igreja e lugar importante, onde a maioria dos fiéis faz sua experiência eclesial com Jesus Cristo (cf. Aparecida n° 304).
Mas, para que possa ajudar a Igreja na sua missão no mundo de hoje, a paróquia precisa passar por um processo de conversão e reestruturação. Na Conferência de Aparecida, os bispos dizem que o que mais se deseja e necessita na América Latina é “uma valente ação renovadora das paroquias”, para que possam ser de verdade (a) espaços da iniciação cristã e da educação e celebração da fé; (b) abertas à diversidade de carismas, serviços e ministérios; (c) organizadas em modo comunitário e responsável; (d) integradoras de movimentos de apostolado já existentes; (e) atentas à diversidade cultural dos seus habitantes; (f) abertas aos projetos pastorais e supra paroquiais e às realidades circundantes” (Aparecida n° 170). A renovação missionária da paróquia se impõe de modo inexorável, especialmente no mundo urbano, que pede a criação de novas estruturas paroquiais (cf. Aparecida n° 173).
Por isso, como pede o Papa Francisco, cada comunidade e paróquia deve se empenhar e encontrar os meios necessários para “avançar no caminho de uma conversão pastoral e missionária”, pois as coisas não podem ficar como estão e a Igreja precisa se colocar em permanente estado de missão (cf. Evangelii Gaudium n° 25). “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação” (Idem, 27).
O que supõe e exige essa inadiável renovação da paróquia? Supõe verter as iniciativas, atividades e estruturas pastorais e administrativas para uma perspectiva missionária, fazer com que a pastoral ordinária seja mais comunicativa e aberta, situar os diversos agentes e grupos numa atitude de saída ao encontro daqueles a quem Jesus oferece sua amizade (cf. Evangelii Gaudium n° 27). Exige a reformulação das suas estruturas, para que seja uma “rede de comunidades e grupos” que ajudem seus membros a se sentirem discípulos e missionários de Jesus Cristo numa comunhão articulada. A respeito, nossas Constituições são claras: se assumimos a pastoral paroquial, façamo-lo tomando o cuidado para que não inviabilizem nosso carisma missionário e esforçando-nos para formar, com os fiéis, uma comunidade missionaria (cf. Diretório Geral n° 04).
Isso pede que a paróquia seja o espaço onde se recebe e acolhe a Palavra e se realiza a comunhão em torno do Corpo de Cristo, sendo assim a fonte dinâmica do discipulado missionário (cf. Aparecida 172). Daí que os melhores esforços da paróquia devem ser voltados à convocação e à formação de leigos missionários, pois somente através deles a Igreja conseguirá responder às exigências missionárias do momento atual (cf. Aparecida n° 174). Os Bispos do Brasil observam que “a conversão pastoral supõe passar de uma pastoral ocupada apenas com as atividades internas da Igreja a uma pastoral que dialogue com o mundo. A paróquia missionária há de ocupar-se menos com detalhes secundários da vida paroquial e focar-se mais no que realmente propõe o Evangelho” (CNBB, Doc. 100, n° 58).
Esse processo de conversão pastoral e missionária é permanente, e implica no discernimento daquilo que o Espírito pede à Igreja desde dentro dos desafios sociais e culturais nos quais estamos inseridos. E isso exige que façamos a passagem “de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral decididamente missionaria”, fazendo com que a Igreja se mostre uma “mãe que vai ao encontro, uma casa acolhedora, uma escola permanente de comunhão missionária” (Aparecida n° 370).
Sendo evidente que a dimensão social é intrínseca à evangelização, “que toda autêntica missão unifica a preocupação pela dimensão transcendente do ser humano e por todas as suas necessidades concretas, para que todos alcancem a plenitude que Jesus nos oferece”, a paróquia deve responder ao desafio de uma evangelização integral. “Cada paróquia deve chegar a concretizar em sinais solidários seu compromisso social nos diversos meios em que se move, com toda a imaginação da caridade. Não pode ser alheia aos grandes sofrimentos que a maioria de nossa gente vive e que com muita frequência são pobrezas escondidas” (Aparecida n° 176; cf. também ‘Reino de Deus e promoção da dignidade humana’, n°s 380-430).
A firme decisão de “viver e comunicar a vida nova em Cristo a nossos povos”, colocando-nos a serviço da vida plena para todos, unindo amor a Deus e amor ao próximo, fazendo-nos próximos e servidores daqueles que estão longe e trabalhando pela sua libertação integral (cf. Aparecida n° 347-364) pede, também, “conversão pastoral e renovação missionária das comunidades” (cf. Aparecida n° 365-372). Os Bispos insistem que “essa firme decisão missionaria deve impregnar todas as estruturas eclesiais e todos os planos pastorais” das dioceses, paróquias, comunidades movimentos”, de modo que “nenhuma comunidade deve isentar-se de entrar decididamente, com todas as forças, nos processos constantes de renovação missionária e de abandonar as ultrapassadas estruturas que já não favoreçam a transmissão da fé” (Aparecida n° 365).
Por isso, a Igreja “não pode nem deve colocar-se à margem na luta pela justiça”, e saberá encontrar modos e meios oportunos e eficazes para colaborar para que a justiça e a paz se abracem.  Guiar-se-á a Igreja nesse empenho pelo princípio da dignidade e do valor supremo de cada homem e cada mulher, pela opção preferencial e evangélica pelos pobres, pela promoção humana integral e pelo repto de globalizar e internacionalizar a justiça e a solidariedade, especialmente através: da participação na sociedade civil para reabilitar a ética na política; do empenho por uma ética que sustenta a responsabilidade do cidadão pelo seu semelhante, pelo bem comum e pelo ambiente; do engajamento pela regulação social da economia nacional e internacional (cf. Aparecida n° 406).
Considerando que a família é “um dos tesouros mais importantes” e “o valor mais querido por nossos povos” (cf. Aparecida n° 432 e 435), precisamos assumir a família como um dos eixos transversais da ação missionária e evangelizadora, dando vida a uma pastoral familiar intensa e vigorosa, empenhada em (a) proclamar o evangelho da família; (b) promover a cultura da vida; (c) trabalhar para que os direitos das famílias sejam reconhecidos e respeitados.
Para realizar sua missão e cumprir sua finalidade, a pastoral familiar devidamente organizada em nossas paroquias e comunidades pode desenvolver diversas iniciativas e ações: (1) estimular grupos e projetos que promovam famílias evangelizadas e evangelizadoras; (2) engajar-se na luta por leis e políticas a favor da vida, do matrimônio e da família; (3) estimular e promover a formação integral para a convivência em família; (4) criar centros e redes que acompanhem e ajudem as famílias em situações difíceis; (5) estudar as causas das crises familiares para encara-las em todos os seus fatores; (6) oferecer formação permanente e qualificada aos agentes da pastoral familiar; (7) acompanhar com cuidado e compaixão os casais que vivem em situação canônica irregular (cf. Aparecida n° 437).
Mas jamais poderá estar fora do horizonte da paróquia e da comunidade o compromisso com a missão ad gentes, pois, como discípulos e missionários, desejamos que a influência do Evangelho de Jesus Cristo chegue aos confins da terra e precisamos estar prontos a “dar a partir de nossa pobreza e a partir da alegria de nossa fé” (cf. Aparecida n° 379). Os interlocutores dessa missão não são apenas os povos não cristãos e as terras distantes, mas também os campos social e cultural dos quais participamos (cf. Aparecida n° 375). E isso pede que cresçamos e amadureçamos como discípulos missionários sem fronteiras, dispostos a fazer a travessia para a “outra margem”. O Papa Francisco lembra que a ação missionária é o paradigma de todo o agir eclesial, e isso supõe uma perspectiva de êxodo, de saída da própria comodidade para alcançar todas as periferias (cf. Evangelii Gaudium n° 15 e 20).

Itacir Brassiani msf

Um comentário:

Unknown disse...

Muito obrigado pela partilha que continua aprofundando e animando nosso curso de missiologia.