terça-feira, 8 de agosto de 2017

A Igreja e o projeto do Temer

Igreja católica E governo Temer
“Eu vi… e ouvi os clamores do meu povo” (Ex, 3,7)
Com essas palavras extraídas do Livro do Êxodo, a Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora da CNBB se pronuncia sobre a crise política em que está mergulhado o país. A mensagem, de 1º de agosto de 2017, é endereçada “aos bispos das Pastorais Sociais”. Estas últimas, por sua vez, representam verdadeiros “exércitos” de agentes pastorais que atuam na base, junto aos operários e desempregados; camponeses e trabalhadores sem terra; migrantes, itinerantes, refugiados e nômades; menores e crianças desnutridas; pescadores e marítimos; mulheres prostituidas e encarcerados... Entre outros representantes das Comunidades Eclesiais.
Vale a pena citar todo um parágrafo da nota que, remetendo-se simultaneamente ao texto bíblico citado, à Constituição Gaudium es Spes do Concícilo Vaticano II e aos documentos da Igreja na América Latina, diz literalmente: “Clamam aos céus, hoje, as muitas situações angustiantes do Brasil, entre as quais o desemprego colossal, o rompimento da ordem democrática e o desmonte da legislação trabalhista e social. O governo, em lugar de fortalecer o papel do Estado para atender as necessidades e os direitos dos mais fragilizados, favorece os interesses do grande capital, sobretudo financeiro especulativo, penalizando os mais pobres, por exemplo com a reforma da previdência, falsamente justificada”.
Palavras duras, claras, veementes e proféticas. Dedo em riste que aponta ao coração mesmo da política econômica do governo Temer. Governo que para pavimentar esse caminho de entreguismo usa de todas os mecanismos e artimanhas que tem ao seu alcance. Prova disso foi a vitória envergonhada na Câmara dos Deputados para engavetar as denúncias que há tempo pesam sobre a autoridade máxima da nação. Nunca se viu funcionar com tamanha eficácia a troca de titulares por suplentes e a pressão do executivo sobre o legislativo, bem como a prática do “balcão de negociatas” entre ambos os poderes. Ou, mais prosaicamente, a compra e venda de privilégios e benefícios. Resta perguntar se a mesma estratégia funcionará para as próximas denúncias já em andamento pelo Ministério Público.
Os bispos estão cheios de razão. De fato, a política atual, com uma onda de privatizações, com a liberação do mercado total e com reformas que penalizam os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, o governo caminha na contramão dos “clamores” que chegam das bases. Surdo e cego às vozes das ruas, segue seu programa que traz, ao mesmo tempo, concentração de riqueza e exclusão social. Resulta disso o “desemprego colossal”, a falta de apoio a pequenos e médios produtores, empreendedores ou comerciantes, a fuga de cérebros para o exterior, a precarização crescente dos serviços públicos. Estes últimos acabam reconvertidos em mercadorias a serem vendidas por empresas privadas, evidentemente a preço de mercado. Bens pagos duplamente: primeiro, com a carga de impostos e, agora, com a elevação dos preços.
Uma pergunta conclusiva: que impacto terá esse pronunciamento não somente sobre os participantes das pastorais sociais, mas também sobre os movimentos sociais, as organizações não governamentais e trabalho de base em geral – hoje aparentemente tão fragmentados? Como poderão ser sacudidos o descrédito, a apatia e o marasmo que parecem ter dominado não poucas forças vivas da nação? Ou melhor, como canalizá-las num projeto popular em vista do “Brasil que queremos”, como se dizia na segunda Semana Social Brasileira, em meados da década de 1990? Perguntas cuja resposta só poderá levantar-se do chão!

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs – Roma, 7 de agosto de 2017

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