terça-feira, 31 de outubro de 2017

ANO A – TRIGÉSIMO-PRIMEIRO DOMINGO DO TEMPO COMUM – 05.11.2017

Jesus nos convida a sonhar e ensaiar uma nova humanidade!
Qual é o núcleo dinâmico do anúncio cristão? Mesmo conscientes de que o Evangelho que recebemos não é uma simples doutrina teológica, e já veio marcado pelos condicionamentos culturais, religiosos e políticos dos primeiros cristãos, precisamos fazer um esforço para identificar os contornos da boa notícia cujo anúncio nos foi confiado. E sabemos de antemão que este núcleo vai mostrando novas facetas à medida em que entra em contato com culturas diferentes e dialoga com cada época histórica.
Na segunda parte do trecho do Evangelho proposto para este domingo podemos identificar alguns elementos essenciais do conteúdo deste anúncio: todos somos irmãos e irmãs, porque temos um único mestre, um único guia e um único pai; Deus age elevando os rebaixados e rebaixando os que se consideram superiores; diante de Deus não valem critérios como pertença a uma classe ou uma nação, cumprimento externo e estrito de leis, méritos acumulados por práticas de piedade.
É evidente que, para que seja compreendido e mereça crédito, este anúncio precisa vir acompanhado da prática que lhe corresponde. O anúncio missionário da Igreja pressupõe que ela se organize, se apresente e viva como uma comunidade de irmãos e irmãs, na qual a igualdade fundamental de todos seja respeitada, buscada e proclamada. Sem a coerência do missionário e da comunidade que ele representa, o anúncio soa como dissonante, e seu efeito libertador acaba sendo reduzido e até anulado.
É neste contexto que podemos compreender a profundidade e a contundência da crítica que Jesus faz às lideranças religiosas do seu tempo. A primeira impressão diante de Mt 23,1-7 é de que é uma ladainha de ódio e ressentimento. Mas se trata de uma linguagem polêmica, de um estilo de discurso muito conhecido no ambiente de Jesus, cujo objetivo era mais estabelecer a diferença qualitativa do próprio grupo que atacar e desqualificar os adversários. É uma linguagem própria de grupos marginais.
Esta espécie de lista de insultos tem como objetivo formar e reformar a conduta dos discípulos. Jesus fala a eles e às multidões com a intenção de estabelecer claramente a diferença entre a atitude que se espera deles e a prática comum e condenável dos doutores da lei, dos fariseus e dos escribas: eles não praticam o espírito da lei que leem e ensinam; impõem pesadas obrigações legais sobre os fiéis; não ajudam o povo em suas necessidades; fazem tudo com o desejo de serem honrados e reconhecidos.
Efetivamente, os grupos sócio religiosos (não se trata de indivíduos!) criticados por Jesus gozam de um notável poder religioso, cultural e social. Num mundo no qual a maioria das pessoas não eram alfabetizadas e as cópias dos textos sagrados eram poucas, a possibilidade de ter acesso a estes textos e poder lê-los era um privilégio reservado a poucos, e fator de honra e poder. E o problema maior era a interpretação destes textos, feita a partir dos interesses desta minoria e do controle da vida do povo.
Criticando tal postura, Jesus Cristo lança as bases da Igreja como comunidade ou família com um estilo de vida alternativo, igualitário ou não-hierárquico. “Um só é o vosso mestre e todos vós sois irmãos!” A igualdade fraterna que a Igreja é chamada a ensaiar e anunciar se apoia sobre este tríplice pilar: um único mestre, Jesus Cristo; um só Pai, que está no céu; um único guia ou instrutor, o Messias. Desse pilar brota o mandamento: “O maior dentre vós deve ser aquele que serve!” O maior e mais excelente não é quem coleciona diplomas, se veste de púrpura, usa mitra ou báculo, anel ou batina, mas quem faz de si mesmo um dom solidário e generoso para promover os últimos.
Jesus não se contenta em dizer “vós sois irmãos”, mas faz questão de dizer “todos vós sois irmãos”. Trata-se de uma igualdade radical e total. A organização da Igreja deve partir disso. Este princípio operacional, por sua vez, é consequência de outro, mais fundamental: “Um só é o pai de vocês, aquele que está no céu.” A figura do pai é mais adequada para expressar o ser de Deus, pois ele faz nascer o sol sobre bons e maus, tem olhos para a pessoa e as ações que passam despercebidas, esconde seus segredos aos sábios e potentes e os revela aos pequenos e humildes (cf. Mt 5,45; 6,6; 11,25-26).
Deus pai e mãe, origem, coração e meta de toda missão: te agradecemos pela nuvem de testemunhas que despertaste no passado e suscitas e sustentas ainda hoje. Que elas se mantenham radicalmente livres e humildes, libertas do peso de uma Igreja poderosa, hierarquizada, dona da verdade e da vida. Que estes homens e mulheres renascidos do teu Espírito vivam e testemunhem a evangélica alegria de pertencer a uma comunidade de iguais, onde a pessoa mais humilde e servidora seja a mais honrada. Assim seja! Amém!

Itacir Brassiani msf
  (Profeta Malaquias 1,1-4.2,2 * Salmo 130 (131) * 1ª. Carta aos Tessalonicenses 2,7-13 * Evangelho de S. Mateus 23,1-12) 

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