quinta-feira, 12 de abril de 2018

ANO B – TERCEIRO DOMINGO DA PÁSCOA – 15.04.2018


A fé na ressurreição fortalece o compromisso com a missão.
Continuamos caminhando à luz de Jesus Cristo, o santo e justo preso ilegalmente e assassinado, depois descoberto e experimentado vivo e ressuscitado pela comunidade dos discípulos. As celebrações de cada domingo nos ajudam a ajuntar, pouco a pouco, os fragmentos das diversas experiências e recompor um mosaico capaz de ilustrar como Jesus ressuscitado se manifesta e onde se deixa encontrar. Mas as escrituras revelam também as dificuldades que enfrentamos para organizar nossa vida a partir de um Deus crucificado e assimilar as exigências que essa fé traz consigo.
Me impressiona muito a diferença entre a atitude dos discípulos nos primeiros dias após a crucifixão e ressurreição de Jesus e nas cenas descritas pelos Atos dos Apóstolos. A cena do Evangelho de hoje ocorre depois do testemunho das mulheres e da comprovação por parte de Pedro de que a sepultura estava vazia (Lc 24,1-12); depois da manifestação de Jesus aos dois discípulos na estrada de Emaús e na partilha do pão (Lc 24,13-35); e depois da aparição a Pedro (Lc 24,34). Apesar disso, a nova manifestação de Jesus os espanta, e eles têm dificuldade de acreditar. Como entender essa reação?
A cruz é a verdadeira pedra na qual os discípulos tropeçam. Para eles, é difícil conjugar a ideia de um Deus que se caracteriza pelo poder e pelo saber com um homem que grita impotente e morre abandonado na cruz. Dizer que Jesus não é o Messias, mas um profeta fracassado, ou pensar que Jesus é mesmo o Messias mas a cruz foi um faz de conta é uma saída fácil, mas também frágil. Ainda hoje muitos cristãos preferem um Cristo vitorioso e glorioso. No máximo, aceitam que ele passou pela cruz, mas muito rapidamente, e seu sacrifício foi compensado pela imensa glória que depois recebeu do Pai...
A ressurreição de Jesus não pode ser vista apenas como uma espécie de prêmio que o Pai dá ao Filho obediente e sofredor. O que se afirma com a ressurreição de Jesus é algo bem mais sério e mais profundo que a simples ressurreição dos cadáveres. Aquele que ressuscitou não é alguém que morreu com idade avançada num hospital de primeira classe, rodeado de familiares e amigos. O ressuscitado é Jesus de Nazaré, aquele que resgatou a dignidade dos excluídos e foi condenado injustamente, por um conluio de autoridades religiosas e políticas, como vimos se repetir nos últimos dias aqui no Brasil, com outro personagem. Ressuscitando-o Deus confirma a validade e a justeza da causa que o levou à morte.
Diante do espanto e da perturbação dos discípulos, Jesus mostra-lhes as chagas nas mãos e nos pés e pede para que as toquem. Com isso, Jesus quer sublinhar a continuidade do amor que o levou a abraçar a cruz. As feridas nas mãos e nos pés do corpo ressuscitado são o sinal eloquente de que Jesus é fiel e se tornou nosso advogado de defesa, como diz São João. Ele não é fruto da fantasia de um grupo de discípulos, e chega instaurando uma paz verdadeira.  Para evitar qualquer fantasia, Jesus pede algo para comer, recebe um peixe e o come diante dos discípulos tão alegres quanto espantados.  
Ancorado na fé em Jesus Cristo, Pedro curou e devolveu a dignidade a um miserável paralítico. E diante do assombro da multidão que acorria ao templo, proclama: “A fé em Jesus deu saúde perfeita a esse homem que está na presença de todos vocês.” Os cristãos dão testemunho da ressureição de Jesus à medida em que se deixam guiar pelo dinamismo que animou e deu sentido à sua vida: o amor ao próximo, o serviço solidários aos últimos. Esse é o mandamento e o testamento de Jesus, e “quem diz que conhece a Deus mas não cumpre seus mandamentos é mentiroso”, diz João.
Na sua manifestação aos discípulos, Jesus abre-lhes a inteligência para que compreendam as escrituras. Não se trata de uma longa e completa catequese bíblica, mas de um esclarecimento sobre a imagem de Messias: seu caminho se desvia do poder e da impassibilidade e passa pela aceitação do sofrimento solidário e, em seu nome, as pessoas serão convocadas à conversão e perdoadas. Não é possível adentrar no sentido da ressurreição se não nos movemos num horizonte de esperança, se não aceitamos a possibilidade de uma transformação profunda de todas as coisas, já em curso.
Jesus de Nazaré, Servidor da humanidade e Aurora da liberdade: sabemos que em ti começamos a vencer a morte nas suas expressões mais terríveis, mas temos consciência que a luta continua. Abre nossa inteligência para vivermos como ressuscitados, com olhos abertos às chagas das pessoas que continuam sofrendo e às iniciativas solidárias que ocorrem fora das nossas Igrejas. Faz com que nossa esperança na ressurreição corte pela raiz as tentativas de reduzir o cristianismo a um exercício intelectual ou à aceitação de um conjunto de dogmas e preceitos. Assim seja! Amém!
 Itacir Brassiani msf
(Atos dos Apóstolos 3,13-19 * Salmo 4 * 1ª Carta de João 2,1-5 * Evangelho de São Lucas 24,35-48)

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